editorial da Folha de São Paulo
No conjunto de medidas impopulares para recuperar a credibilidade
perdida e tentar colocar a economia nos trilhos após as eleições, a alta
de juros foi apenas a primeira –e a mais fácil. Agora vem o desafio
maior do governo: convencer a sociedade de que as contas públicas estão
sob controle.
Na sexta-feira (31) tornou-se conhecido o rombo de setembro, R$ 69
bilhões, o maior da história quando se considera todo o setor público.
No acumulado do ano, são R$ 224,4 bilhões (5,94% do PIB) negativos,
incluindo os juros.
Quando se toma somente o resultado primário (a diferença entre receitas e
despesas antes do pagamento de juros), o quadro é igualmente
preocupante. Houve deficit de cerca de R$ 15 bilhões (0,4% do PIB) no
período, algo inédito desde o início do Plano Real, em 1994.
Confirma-se o que já era sabido: será impossível atingir a economia
prometida de R$ 99 bilhões neste ano. Nem mesmo o recurso à dedução de
investimentos do PAC e desonerações, previsto em lei, bastará para
deixar a conta no azul.
O governo precisará pedir ao Congresso a ampliação desses descontos, a
fim de não descumprir a Lei de Responsabilidade Fiscal –pelo menos
formalmente.
A questão mais importante, agora, diz respeito às metas de 2015. Com a
arrecadação estagnada e considerado o buraco atual, parece impraticável o
saldo primário de 2,5% do PIB estipulado para o próximo ano. O governo
deve indicar um caminho suave para restaurar as contas, mas precisará
mostrar convicção e retomar o compromisso com a transparência.
Tudo sugere que alguns impostos que não dependem dos congressistas
voltarão, como a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico
(Cide), incidente sobre combustíveis. Não se descarta, ademais, que o
governo desista de prolongar a redução das alíquotas de IPI sobre
automóveis para além de dezembro.
Como medidas tributárias mais amplas dependem do Congresso, o Executivo
não pode contar com elas. Grandes cortes nas despesas soam inevitáveis,
portanto.
Delineia-se, assim, um ajuste recessivo. Juros mais altos e orçamento
austero devem acentuar, no curto prazo, a tendência de baixa na
economia, o que era negado pela presidente Dilma Rousseff (PT) em sua
versão candidata.
A aposta do governo é que o pacote ortodoxo restaurará a confiança do
setor privado, destravando investimentos. Parece difícil, todavia,
acreditar que os empresários serão tomados por súbito ânimo.
O arrocho pode comprometer ainda mais a geração de emprego, que já tende
à estagnação. Se os postos de trabalho começarem a fechar, Dilma
perderá sua última bandeira na economia.
fonte rota2014
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