editorial de O Globo
A PEC da proibição das pesquisas se insere numa rotina, a da campanha subliminar pela restauração da censura prévia, sob diferentes formatos e a qualquer pretexto
Está na Comissão de Constituição e Justiça do Senado uma Proposta de
Emenda à Constituição (PEC) proibindo a divulgação de pesquisas
eleitorais nos 15 dias que antecedem o primeiro e segundo turnos de
votação. Políticos interessados e defensores da iniciativa argumentam
com a suposta necessidade “proteção” do eleitor, contra o “desperdício”
de voto em candidatos eventualmente mal situados nas sondagens.
Inexiste dúvida quanto ao confronto dessa iniciativa com os princípios
fundamentais da Constituição, no caso, a liberdade de acesso à
informação e a liberdade de expressão.
É matéria vencida: em 2006, a pretexto de um ajuste nas regras
eleitorais, o Congresso aprovou proposta similar. Ela foi derrubada —
por unanimidade, lembre-se —, no Supremo Tribunal Federal. A Corte
decidiu que tal mudança não tem cabimento porque corrói um dos pilares
do regime democrático: o direito de acesso do cidadão à informação —
como registrou apropriadamente o então relator do caso, ministro Ricardo
Lewandowski.
Ficou estabelecido que se tratava de iniciativa em ofensa direta ao
Artigo 5º da Constituição, onde estão abrigadas garantias e direitos
fundamentais dos brasileiros — ou seja, a essência do regime
democrático.
O Legislativo não deve permitir que artifícios do gênero conduzam o país
a patamar digno de uma fictícia República de Sucupira, nascida da
imaginação brilhante do dramaturgo Dias Gomes. Afinal, como registrou o
ministro Lewandowski, em 2006, “vedar-se a divulgação de pesquisas a
pretexto de que estas poderiam influir, de um modo ou de outro, na
disposição dos eleitores, afigura-se tão impróprio como proibir-se a
divulgação de previsões meteorológicas, prognósticos econômicos ou
boletins de trânsito antes das eleições.”
Essencialmente, mais uma vez coloca-se em jogo a liberdade. Notável é
que parcela relevante daqueles que se têm manifestado perturbados pelo
regime vigente de liberdade, nos últimos anos, é composta por agentes
públicos, com ou sem mandato. É o que explica, por exemplo, o
persistente questionamento da liberdade de imprensa em foros judiciais,
inclusive os de pequenas causas. São majoritariamente agentes públicos
que não aceitam a submissão à informação e à crítica pública.
A PEC da proibição das pesquisas se insere nessa rotina — a da campanha
subliminar pela restauração da censura prévia, sob diferentes formatos e
a qualquer pretexto. O objetivo é sempre o mesmo: atentado à liberdade.
Melhor faria o Congresso se, além de repudiar preliminarmente a
iniciativa, voltasse suas energias para reforçar as garantias e direitos
previstas no Artigo 5º da Constituição, restringindo de saída ofensivas
de agentes públicos contra os consagrados princípios do regime
democrático.
fonte rota2014
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