, editorial do Estadão
Ninguém com pelo menos dois neurônios funcionando pode ter-se
surpreendido com o fato de o presidente do Bradesco, Luiz Trabuco, ter
gentilmente recusado o convite de Dilma Rousseff para se tornar ministro
da Fazenda. Trabuco compareceu ao Palácio da Alvorada acompanhado de
Lázaro Brandão, o presidente do Conselho do banco, sabendo que estava
apenas cumprindo o dever de cortesia que a situação impunha. Não
estivesse a presidente reeleita trabalhando com uma lista espantosamente
pequena de nomes cogitados para o cargo, seria o caso de afirmar que
ela nunca teve a intenção de ter o presidente de um dos maiores bancos
do País à frente do Ministério da Fazenda, e só chamou Trabuco a
Brasília porque sabia que o convite não seria aceito. Seu objetivo era
fazer publicamente um gesto de simpatia e "confiança" ao mercado.
O fato é que toda a movimentação do Palácio do Planalto em torno da
escalação do Ministério do segundo mandato, em particular da pasta da
Fazenda, demonstra que não se pode esperar, a partir do ano que vem, uma
presidente da República diferente daquela que o País conheceu nos
últimos quatro anos, à frente de uma administração comprovadamente
incompetente: ideologicamente sectária e pessoalmente autoritária e
intransigente. Dilma Rousseff é intervencionista por formação e
militância e como tal nutre extrema desconfiança - se não completa
aversão - pelo empreendedorismo privado.
Esse perfil é completado por um temperamento irascível, que se manifesta
diante de qualquer contrariedade. Que o digam os auxiliares que com ela
convivem, inclusive os ministros.
A renovação de um mandato presidencial não significa necessariamente a
necessidade de reformulação do primeiro escalão do governo. Partindo do
princípio de que não se mexe em time que está ganhando, a unanimemente
reconhecida necessidade da escalação de novos auxiliares para cargos
importantes como o de ministro da Fazenda revela apenas que a chefe do
governo e seu criador sabem muito bem que nos últimos quatro anos quase
tudo deu errado.
Essa questão foi colocada nas eleições de outubro e democraticamente
resolvida nas urnas. Dilma Rousseff será a presidente de todos os
brasileiros por mais quatro anos e como tal deve ser aceita e
respeitada.
Resta, portanto, a cada um cumprir seu papel na discussão nacional sobre
a formação do novo governo, emblematicamente simbolizada pelos
entendimentos para a escolha do sucessor de Guido Mantega no Ministério
da Fazenda. Um ministro que, aliás, tem todos os motivos para não estar
nada satisfeito com o fato de que sempre fez rigorosamente tudo o que a
chefe mandou e agora é descartado como se fosse o responsável único pelo
mau desempenho da economia.
Se dependesse de Lula, que sempre exibiu poderosa intuição e forte
sensibilidade política, a condução da economia voltaria a ser entregue a
um ministro mais identificado com o mercado e capaz de recuperar a
confiança dos empreendedores nacionais e dos investidores estrangeiros.
Não há, afinal, outra maneira de o País voltar a crescer social e
economicamente.
Dilma, porém, é teimosa. Jamais se disporá a abrir mão da prerrogativa
de comandar ela própria a política econômica, o que significa que
provavelmente o País continuará a ter mais do mesmo.
Diante disso, é praticamente certo que o novo ministro da Fazenda - que
não havia sido escolhido até o momento em que escrevíamos este editorial
- será alguém disposto a colocar sua biografia a serviço dos desígnios
de uma chefe de Estado obcecada pela ideia anacrônica de que o Estado é
fim e não meio.
Receber convite para assumir a pasta da Fazenda sempre foi motivo de
orgulho e honra para qualquer homem público. Hoje essa investidura
parece estar restrita a quem estiver disposto a pagar o preço de - em
troca de alguma notoriedade passageira - levar a culpa se as coisas não
derem certo ou aplaudir a chefe na improbabilidade de ocorrer o
contrário.
fonte rota2014
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