editorial de O Globo
Investigações da PF e ações do MPF, dentro do espírito republicano, ajudam a consolidar os mecanismos de defesa do Estado sem ameaças de rompimento constitucional
Desde março, quando o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa e o
doleiro Alberto Youssef foram presos pela Polícia Federal, na ponta
inicial de um processo de investigações que revelou a existência de um
esquema bilionário de corrupção na estatal e expôs à luz um dos maiores
escândalos da história do país, não têm sido poucas as revelações
trazidas a público pela Lava Jato. A operação investiga a existência de
uma rede — que junta executivos da maior empresa brasileira, políticos e
a alta cúpula de empreiteiras com longo histórico de serviços prestados
à Petrobras — responsável por um mecanismo de lavagem de dinheiro, que
teria movimentado em torno de R$ 10 bilhões, e por desvios de recursos
da companhia.
No rastro das duas prisões iniciais, que levaram a acordos de delação
premiada entre Costa e Youssef, a Justiça Federal, a PF e o Ministério
Público chegaram, semana passada, à ponta corruptora do esquema, algo
praticamente inédito no país nesse tipo de processo. Foram presos, em
razão das confissões da dupla, executivos e funcionários de nove grandes
empreiteiras que têm contratos com a Petrobras, somando valores que
chegam a quase R$ 60 bilhões. Procuradores federais já rastrearam em
torno de R$ 154 milhões em propinas distribuídas a pessoas denunciadas
como operadores do PT e do PMDB dentro da estatal.
Tanto quanto o vulto dos valores revelados, cargos e instâncias de
decisão envolvidos (situados nas cúpulas, ou próximo delas, da Petrobras
e das empreiteiras) e a eficiência das investigações, a Lava Jato tem
se caracterizado também por representar a consolidação do amadurecimento
das instituições do país. PF e o MPF têm tido comportamento exemplar,
republicano, mesmo com todas as evidências de que as diligências possam
alcançar gabinetes no centro do poder. Tudo tem sido feito dentro dos
ritos do estado democrático de direito, sem o recurso a ações de
arbítrio, sem ameaças à ordem constitucional, mas, não menos importante,
com as medidas exemplares que um processo de tal magnitude exige.
A desconstrução do esquema de corrupção na Petrobras, que conduz de
imediato a cabeças coroadas de governistas, e não poupa empresários, não
se limita à identificação (e, com certeza, punição) dos atores
envolvidos. Além da revisão de contratos firmados pela estatal à sombra
dessa rede deletéria, e do, espera-se, lançamento de novas bases nas
relações entre empresas privadas e órgãos do poder público, a Lava Jato
tem outra particularidade. Se não inéditos, mas com certeza raros, os
acordos feitos por envolvidos no esquema de corrupção para devolver
milhões de reais amealhados indevidamente representam um elemento
fundamental no desmonte dessa engrenagem.
Vale lembrar, ainda, que a investigação leva sete meses, atravessou uma
campanha presidencial e, por certo, avançará pelo novo governo, sem que a
normalidade constitucional esteja sendo arranhada. São evidências
inquestionáveis do avanço institucional do país.
FONTE ROTA2014
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