editorial do Estadão
Sempre cobrado pela tibieza de seu comportamento como principal partido
da oposição desde o primeiro mandato de Lula, inclusive quando estourou o
escândalo do mensalão, o PSDB demonstrou em seu programa gratuito de
televisão veiculado na terça-feira a disposição de endurecer as críticas
ao governo petista, fazendo eco às manifestações de protesto que têm
levado milhões de brasileiros às ruas. Coube ao ex-presidente Fernando
Henrique Cardoso, secundado pelo senador Aécio Neves, presidente
nacional do partido, elevar o tom dos ataques, mirando principalmente em
Lula, a quem atribui a responsabilidade pela “raiz da crise atual”.
Talvez intimidados pelo forte impacto do populismo lulopetista na cena
pública brasileira – e até mesmo na internacional –, depois de serem
derrotados no pleito presidencial de 2002 os tucanos se recolheram a uma
postura cautelosa em relação ao governo do PT, comportamento que chamou
a atenção pelo contraste com o padrão extremamente agressivo de
oposicionismo praticado desde sempre pelos petistas. A “moderação”
tucana – justificada então pela preocupação com a estabilidade
institucional – foi uma das razões que possibilitaram, em 2005/2006, que
o presidente Lula desse a volta por cima do escândalo do mensalão e se
reelegesse com relativa facilidade para consolidar a hegemonia
lulopetista que agora a incompetência e teimosia de Dilma Rousseff se
encarregam de demolir.
Logo depois das imagens dos panelaços que afastaram Dilma de suas
habituais arengas televisivas, FHC disse que “a crise atual foi plantada
bem antes da eleição da atual presidente” e atacou: “Os enganos e
desvios começaram já no governo Lula. O que a realidade está mostrando é
que nunca antes neste país se errou tanto nem se roubou tanto em nome
de uma causa, mas dessa vez o desarranjo foi longe demais: a crise já
atinge o bolso das pessoas”.
E acrescentou, explorando a repulsa nacional à corrupção generalizada na
esfera federal: “Não só a Petrobrás foi roubada. O País foi iludido com
sonhos de grandeza enquanto a roubalheira corria solta. O que já se
sabe sobre o petrolão é grave o suficiente para que a sociedade condene
todos aqueles que provocaram tamanho escândalo, tamanha vergonha”.
O tom acusatório duro é uma novidade no comportamento do habitualmente
sereno e racional sociólogo que sempre brilhou mais nos livros e debates
do que nos palanques. Mas é um desempenho que parece sinalizar o
despertar da consciência tucana de que urge afinar o discurso com a voz
das ruas e se expor abertamente para garantir eficácia a sua aspiração
de apresentar-se como alternativa democrática a um modelo de governo
populista que já não tem mais coelhos para tirar da cartola.
Essa tarefa fica mais complexa num contexto surreal em que o papel de
contraponto político ao Palácio do Planalto é usurpado pelos principais
aliados do governo, os peemedebistas sob comando de um trio singular: o
vice-presidente da República, Michel Temer, eventual substituto de
Dilma, e os presidentes do Senado e da Câmara, Renan Calheiros e Eduardo
Cunha, que, de maneira educada, poderiam ser qualificados como
pragmáticos.
O ataque à corrupção simbolizada pelo escândalo da Petrobrás, no
entanto, é tema das legendas por definição oposicionistas, como o PSDB,
uma vez que os integrantes da “base aliada”, como é teoricamente o PMDB,
têm todos os motivos para evitar o assunto.
É nessa linha de raciocínio que, no programa de televisão, o senador
Aécio Neves permitiu-se ser quase explícito no envolvimento de Lula e
Dilma com o petrolão: “O Brasil precisa saber definitivamente quem
roubou, quem mandou roubar e quem, sabendo de tudo, se calou ou nada fez
para impedir”.
A investida do PSDB, que certamente provocará forte reação do PT,
demonstra que os tucanos aprenderam com o erro cometido em 2005 diante
do mensalão. Como não faz sentido gastar munição apenas com uma Dilma já
muito enfraquecida politicamente, pretendem manter na mira, sob fogo
cerrado, a única esperança de sobrevivência do PT: seu criador.
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