por Merval Pereira O GLOBO
A
ressaca da comemoração da aprovação do novo ministro do Supremo
Tribunal Federal Luiz Fachin chegou rápido para o governo, que acabou a
semana parlamentar com dor de cabeça: tanto na Câmara quanto no Senado
foram adiadas votações importantes para o ajuste fiscal pelo perigo de
uma derrota do governo.
O
Senado adiou para a próxima terça-feira a votação da Medida Provisória
665, que endurece as regras do pagamento do seguro-desemprego e do abono
salarial. Na Câmara, a votação do projeto de lei que reduz a
desoneração da folha de salários, um dos principais pontos do ajuste
fiscal do governo, foi adiada para a segunda semana de junho.
Pior:
o relator do projeto, deputado Leonardo Picciani, muito ligado ao
presidente da Câmara Eduardo Cunha, quer definir apenas para dezembro a
entrada em vigor das novas medidas.Tudo isso significa atraso no
reajuste fiscal, que terá de buscar em outro lugar o dinheiro que
pretendia economizar ainda este ano.
E
o risco de derrota não é devido apenas à oposição. Onze senadores do
PT, PMDB, PSOL, PDT e PSB, mais movimentos sociais como MST e CUT, além
de petistas como Tarso Genro e Valter Pomar, assinaram um "Manifesto
pela mudança na política econômica e contra o ajuste".
A
perspectiva de que a base aliada do governo estivesse sendo reagrupada
pelo trabalho de bastidores do vice-presidente Michel Temer, que abriu
as torneiras de nomeações, já estava sendo comemorada pelo Palácio do
Planalto, mas mostrou-se vã com as reações da Câmara e do Senado, que
até mesmo quando seus líderes se desentendem encontram caminhos
convergentes para fragilizar o governo.
A
derrota na Câmara do projeto de manutenção do Fator Previdenciário será
apoiada pelo Senado, que já antecipou postura semelhante através de seu
presidente Renan Calheiros.
Todos
esses movimentos vistos em conjunto significam que o governo já perdeu a
condição política de assegurar à equipe econômica a aprovação de pontos
importantes do reajuste fiscal.
O
que parecia apenas um incômodo de parte da base aliada, especialmente
do PT e de partidos de esquerda, em apoiar um programa de cortes de
gastos que atinge especialmente classes sociais menos protegidas como os
aposentados e pensionistas, e aumenta os custos das empresas com o fim
das desonerações, está se transformando em um movimento político que
rejeita as linhas mestras do ministro da Fazenda escolhido nas hostes
adversárias para fazer o trabalho que o petismo não sabe e não quer
fazer, isto é, acabar com o desperdício e equilibrar as contas públicas.
O
problema é que, como a oposição vem cobrando desde o primeiro momento,
não há nenhum gesto do governo para cortar seus próprios gastos, o que
transforma o Congresso em instrumento de medidas impopulares.
O
ministro da Fazenda Joaquim Levy já mandou seu recado recentemente à
base rebelada: ou faz o ajuste, ou tem que aumentar imposto. Claro que o
governo não gostaria de aumentar imposto, porque é uma medida
antipática, prejudica a sociedade de maneira geral e o único culpado
seria ele.
O
melhor caminho seria economizar com medidas aprovadas pelo Congresso,
mas como deputados e senadores, aparentemente, não estão dispostos a
assumir nenhuma medida antipática para ajudar o governo, vai ser um
problema.
Ele
terá de assumir uma parte desse sacrifício com aumento de impostos e
estará sujeito a críticas, que já começam a aparecer em forma de
manifestos da base aliada que lhe tiram poder político.
Sem
apoio político de sua própria base, e às voltas com as pressões do PMDB
através dos presidentes da Câmara e do Senado, empenhados em vetar a
recondução do Procurador-Geral da República Rodrigo Janot ao cargo em
agosto, a presidente Dilma fica sem condições práticas de fazer o ajuste
fiscal, única maneira de reequilibrar a economia e permitir o superávit
de 1,2% prometido por Joaquim Levy ao mercado.
Os
únicos argumentos que o governo tem para reverter a situação é ameaçar
com o aumento de impostos ou com o risco de rebaixamento da nota de
crédito pelas agências internacionais, o que afetaria definitivamente a
combalida economia brasileira, que fechou o trimestre com PIB negativo e
inflação e desemprego em alta.
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