por Eliane Cantanhêde
O PSDB e seus aliados, DEM, PPS, PSC e Solidariedade, miraram no que
viram e acertaram no que não viram: ao entrarem com uma ação penal
contra a presidente Dilma Rousseff, deixam o procurador-geral da
República, Rodrigo Janot, na maior saia justa. A principal decisão
depende dele.
O esforço da oposição é para se equilibrar entre a pressão da opinião
pública pelo impeachment e a constatação, nua e crua, de que não há
ambiente jurídico e político para a empreitada. Por isso, oposicionistas
debatem com entusiasmo uma questão de ordem semântica: a palavra
“impeachment” não integra nenhum texto legal no Brasil e o importante é
pedir, em bom e claro português, o “afastamento” da presidente. Não
importam os meios (jurídicos), importam os objetivos (práticos e
políticos). Logo, a oposição não trabalha pelo impeachment, mas pelo
afastamento de Dilma. Dá para entender?
Esse contorcionismo vem desde que o ex-presidente Fernando Henrique
desautorizou a estratégia do pedido de impeachment e piorou agora,
quando o jurista Miguel Reale Jr. apresenta um detalhado parecer
concluindo que não há elementos que justifiquem um pedido de afastamento
de Dilma com base em crime de responsabilidade, mas há elementos para
enquadrá-la em crime comum.
A oposição acusa Dilma de, no seu primeiro mandato, ter fechado
artificialmente as contas públicas atrasando os repasses do Tesouro
Nacional para bancos públicos pagarem benefícios sociais. A manobra, ou
maquiagem, foi apelidada de “pedalada fiscal” e é considerada crime.
“Collor caiu por uma Elba, Dilma vai cair por uma bicicleta”, anima-se o
líder tucano, Cássio Cunha Lima. Dilma, porém, não pode ser acusada de
crime de responsabilidade – ou seja, não pode sofrer processo de
impeachment tradicional – por atos anteriores ou estranhos ao exercício
do cargo. Logo, o jeito tucano é processá-la por crime comum.
O artigo 86 da Constituição é claro. No crime de responsabilidade, o (ou
a) presidente é julgado(a) politicamente pelo Senado e, no crime comum,
é julgado(a) juridicamente pelo Supremo Tribunal Federal. Nos dois
casos, o presidente é afastado (na prática, “impeachado”), se o Supremo
recebe a denúncia ou quando o Senado instaura o processo.
Há um longo caminho entre a vontade e a concretização. Na terça-feira,
os cinco partidos entrarão com ação penal contra Dilma na
Procuradoria-Geral. Depois, cabe a Janot dizer sim ou não. Se disser
sim, o Supremo terá ainda de consultar a Câmara. O processo só irá em
frente se dois terços dos deputados autorizarem. E, “last but not
least”, se passar por tudo isso, a ação depende da decisão final dos 11
ministros do Supremo.
Ou seja: há muitos “se”, muitos “mas” e muitos “talvez” nessa operação
toda para que se possa levar realmente a sério a denúncia de tucanos e
afins contra Dilma. Haverá muitas declarações, fotos e documentos, mas a
hipótese de prosperar é remota.
De outro lado, não seria muito diferente se o processo fosse com base em
crime de responsabilidade, ou “impeachment”. Nesse caso, a Câmara
também teria de se manifestar e a decisão final seria do Senado. A
conclusão é a mesma, com outro tempo verbal: a hipótese de prosperar
seria remota.
A Câmara pressiona Dilma, o Senado estica a corda, o próprio PT é um
empecilho para um bom ajuste fiscal e os senadores petistas Lindberg
Farias e Paulo Paim passaram das palavras aos atos contra as mexidas
trabalhistas e previdenciárias. Mas, no final, mesmo que meio
estropiado, o ajuste vai acabar passando.
Isso se repete com o impeachment, ops!, com o afastamento da presidente.
Cidadãos e cidadãs clamam por isso, as pesquisas dão resultados
alarmantes para o Planalto, as oposições vão entrar com a ação penal.
Mas, no final, mesmo que meia estropiada, Dilma vai acabar passando.
Presidentes têm muitas armas. E a vida da oposição é dura.
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