por José Casado O GLOBO
No feirão da Petrobras, privatizar é o epílogo de um projeto político que ainda era construção quando se tornou ruína
Números falam, e nem sempre revelam coisas agradáveis. O caso da
Petrobras sob o governo Dilma Rousseff é exemplar: a estatal perdeu 73%
do valor das suas ações em dólares, entre janeiro de 2010 e dezembro
passado.
Pela calculadora de gestoras de fundos, como a Canepa Assets, equivale a
tocar fogo numa pilha de US$ 83 bilhões — mais de três vezes o valor
estimado do controvertido “ajuste” nas contas governamentais.
É apenas um pedaço da conta. Menos visível é a dívida de US$ 130 bilhões acumulada nos 11 anos dos governos Lula e Dilma.
Nada menos que 80% desses débitos são em moeda estrangeira (dólar e
euro). Nos próximos quatro anos vencem seis de cada dez dólares dessa
monumental dívida externa.
O saldo devedor a ser liquidado no médio prazo soma-se à crescente
necessidade financiamento de pesquisa, exploração e produção de petróleo
nas reservas do pré-sal.
O valor de investimento não é consensual, mas as estimativas da empresa
nunca são inferiores a US$ 20 bilhões anuais — ou US$ 80 bilhões nos
próximos quatro anos.
Apenas para desenvolver um único campo (Libra), segundo as próprias
previsões, ela precisaria investir US$ 32 bilhões na próxima década,
proporcionais à sua fatia de 40% no consórcio responsável pelo negócio.
A Petrobras agora encontra-se numa situação de asfixia financeira, com
evidências de supressão da respiração (pela dívida) e reduzida
circulação (pela escassez de caixa e de crédito).
Inverter o quadro é difícil, mas não impossível. Nem é tarefa exclusiva
do grupo de executivos financeiros no comando da “nossa querida
companhia, símbolo do orgulho nacional”, como tem repetido o presidente,
Aldemir Bendine.
O problema central é político. Está na concepção do “papel estratégico”
da Petrobras como alavanca para um projeto de poder estatal quase
absoluto na condução da economia.
Com Lula e Dilma, essa fantasia já levou a “querida companhia” a perdas de US$ 5,8 milhões por dia, ou US$ 241 mil por hora.
Aconteceu num período de seis anos e sete meses seguidos (entre julho de
2005 e o início de 2012) quando o “símbolo do orgulho nacional” ficou
2.370 dias sob guarda do “companheiro” José Sérgio Gabrielli, expoente
baiano do PT.
Com a complacência de Lula e Dilma, suas digitais espalharam-se por US$
13 bilhões em iniciativas contabilizadas como danosas ao patrimônio da
estatal. A conta não inclui o custo do repasse da corrupção aos
contratos. Também não reflete a escalada no endividamento realizada na
gestão temerária de Gabrielli. Mostra apenas uma face da incúria.
A degradação tende a crescer. De um lado, pelo aumento da pressão
governamental pelo pagamento de dividendos elevados, como contribuição
ao saneamento do déficit público cavado por Lula e Dilma. De outro, pela
persistência do uso da Petrobras como alavanca de um projeto de poder
estatal quase absoluto na economia. Isso, sem que se tenha resposta para
uma questão crucial: com qual dinheiro a empresa, hoje asfixiada, vai
sustentar sua hegemonia na exploração dos campos do pré-sal?
Um feirão de ativos parece ser a alternativa, debate-se no conselho de
administração da estatal. Significa privatizar — epílogo de um projeto
político que ainda era construção quando se tornou ruína.
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