por Marta Suplicy Folha de São Paulo
A imagem do haitiano que se lava em mictório de uma igreja no Glicério, em São Paulo, num abrigo superlotado (capa da Folha nessa
quarta, 20), é um choque por sua insustentável e desumana condição, mas
também por escancarar sem retoques a já tão sabida ineficiência e
dificuldades do atual governo no trato da política externa.
Lula e FHC tinham gosto e interesse, visões com as quais se poderia
concordar ou discordar, mas inegavelmente em matéria de política externa
tinham ousadias, propostas, propósitos. O Brasil retroagiu. Inconteste
que perdeu a projeção geopolítica que galgava.
O Brasil timoneiro de um novo tempo político e econômico era vitrine no
mundo, quando em 2010 um terremoto de assombrosas proporções assolou o
Haiti. Aqui, perplexos choramos a morte de Zilda Arns. Solidários, pois
já atuávamos em missões com a ONU para pacificar protestos violentos,
disputas entre gangues e incertezas políticas do Haiti –queríamos,
também, e ainda queremos um assento no Conselho de Segurança da ONU.
Sem visto de entrada, haitianos ingressaram no nosso país, pagando US$
2.000 a US$ 3.000 a coiotes. Buscando emprego, casa e comida. Passamos a
conceder vistos e já entraram pelo Acre mais de 32 mil "refugiados
ambientais" do Haiti.
Claro que, numa proporção gigantesca como essa, o Estado do Acre não tem
como suportar nem São Paulo, a cidade mais rica do país, e nenhum ente
federativo isoladamente.
Ridículo reduzir a questão ao Ministério da Justiça destinar R$ 1 milhão
para o Acre viabilizar, neste ano, a distribuição de haitianos pelo
país!
Pior é que mandam as pessoas e nem avisam o prefeito, uma total falta de planejamento do mínimo detalhe à macropolítica!
Só com alimentação, já foram gastos mais de R$ 20 milhões e muito mais
se gastará, sem solucionar suas desgraças. Não se trata de negar comida,
abrigo, solidariedade, mas de propostas efetivas.
O Senado pode dar sua contribuição, pois tramitam desde 2013 proposta do
senador Aloysio Nunes e outras que atualizam o Estatuto do Estrangeiro.
Mas não serão suficientes.
É preciso bem mais para enfrentar o problema. A União não pode diante da
sua incapacidade de assumir posições, repassar a Estados e municípios
suas obrigações.
Esta trágica situação ultrapassa a responsabilidade dos entes
federativos que não merecem nem têm condições de enfrentar sozinhos o
problema. Urge que o governo federal, por meio do Itamaraty e Ministério
da Justiça, ao lado da ONU e da OEA, encaminhe uma solução, pois o
exemplo da imigração na Europa mostra que procrastinação não traz
resultado.
extraídadoblogrota2014blogspot
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