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16:13
ANDRADEJRJOR
GUSTAVO FRANCO O GLOBO
A expressão acima, como
as "águas de março" que se espera sempre ao final do verão, é um antigo
presságio. Foi o que Julio César escutou de um vidente, voltando
vitorioso da guerra, no apogeu de seu poder. Ouviu novamente quando ia
ao Senado, e desdenhou da advertência, conforme narram Seutônio e
Plutarco, fontes para a dramatização que Shakespeare fez do episódio.
No
velho calendário lunar romano, os idos caíam no dia 15 de março
próximo, quando vão acontecer passeatas pelo impedimento ou renúncia de
Dilma Rousseff.
A passagem se tornou um clássico sobre o excesso
de confiança que impede um líder inseguro, herói ou charlatão, no topo
de sua glória, de distinguir a cautela da fraqueza. Os grandes homens
sabem da importância do acaso na política, pois tudo pode sempre mudar
num golpe do destino. Não há general vitorioso que não possa ser
esfaqueado por aliados de boa-fé, três meses depois da reeleição, por
motivos vagos, traições imaginárias ou mal-entendidos.
Julio
César percebeu traidores e conspirações por toda a sua volta, como Dilma
Rousseff, que foi presidente do conselho de administração da Petrobrás
durante todos esses eventos horríveis de que se fala a todo momento. Ela
estava muito mais perto disso tudo do que Lula do "mensalão" e, ao que
tudo indica, tudo era uma coisa só, imensa, com diversos personagens em
comum. São dezenas de caracteres secundários, operadores, agentes
políticos, executivos, facilitadores, lobistas, doleiros, qualquer um
deles, ou muitos, poderiam participar da conspiração. Teriam sido mais
de 60 os conspiradores, uma bancada inteira, e exatos 23 a esfaquear
César, segundo os registros.
Quantas punhaladas virão das delações premiadas de teor ainda desconhecido?
Não
há acordo entre os biógrafos se César ia mesmo derrubar a República e
deixar-se proclamar imperador em 44 A.C. Nem se Dilma Rousseff tirou
proveito direto do oceano de dinheiro desviado da Petrobrás, ou se sua
campanha foi mesmo alimentada por dinheiro de corrupção. O fio da dúvida
tece muitas histórias, cada qual põe uma engrenagem em movimento, é
fácil perder o controle da situação.
Num contexto semelhante, o
presidente Collor procurou segregar a economia da crise política ao
substituir Zélia Cardoso de Melo por Marcílio Marques Moreira. Parecendo
mirar-se no exemplo, Dilma livrou-se da sua Zélia mesmo antes de
reeleger-se e também nomeou uma espécie de embaixador com missões
semelhantes: resolver as bombas deixadas por invencionices anteriores,
recompor o relacionamento com os mercados (e com o bom senso) e evitar
que a economia venha a aumentar as dores de cabeça do Palácio.
O
novo ministro precisará da colaboração do acaso (de São Pedro, para ser
mais específico), e também dos bons ofícios de outras santidades e
orixás brasilienses, com os quais poderá ter mais sucesso fazendo
algumas oferendas. Seus primeiros movimentos revelaram muito cálculo: um
pequeno pacote que lhe garante quase metade da meta estabelecida, o
restante da qual facilmente alcançável mediante controle de caixa (o
chamado "contingenciamento"), mesmo com a aprovação do "orçamento
impositivo".
Sobre este último, vale lembrar que a matéria
aprovada não condiz com este título vistoso, pois passa a ser impositiva
apenas a execução das emendas parlamentares individuais e mesmo assim,
com os descontos contidos no próprio dispositivo é muito provável que o
valor executado de emendas fique na sua média histórica na faixa de 0,4%
da Receita Corrente Líquida (RCL). É como se fosse uma "verba de
gabinete" constitucionalmente assegurada, o direito de gastar algo na
faixa de R$ 10 milhões em obras onde quer que o parlamentar julgue
importante.
A batalha de política fiscal terá ainda vários
lances, pois é tido e sabido que a meta de superávit primário de 1,2% do
PIB fixada por Joaquim Levy é para lá de modesta: de 1999 a 2008 esteve
em cerca de 3% do PIB em média. Foi um lance inteligente fixar uma meta
dentro da zona de conforto.
A separação dos assuntos econômicos
dos políticos ia funcionando muito bem, até que a Presidente nomeou um
homem do partido para o comando da Petrobrás, e assim, a empresa foi
arrastada de volta para o torvelinho dos temas "políticos", péssima
providência.
Há, de fato, dois enredos na Petrobrás, não
necessariamente descorrelacionados: um de má gestão, numa extensão
impensável, talvez sistêmica, outro de roubalheira. A desproporção de
valores é flagrante: a incompetência é imensamente mais cara que a
corrupção, daí a insensatez em deixar uma coisa misturar-se com a outra.
A
companhia perdeu US$ 160 bilhões em valor, uma catástrofe, em razão
principalmente da mudança de preço de petróleo, do modelo de exploração
do pré-sal, dos níveis insanos de investimento a que se obrigou a
companhia e da repressão aos preços de derivados. Foi uma trapalhada
histórica em matéria de gestão a ponto de despertar a atenção de Aswath
Damodaran, da Universidade de Nova York, talvez o mais conhecido dentre
os professores de escolas de negócios americanas, uma espécie de guru
internacional no tema de estratégia e avaliação de empresas.
Não
vale aqui detalhar a análise de Damodaran sobre o que descreveu como "a
calamidade" que se abateu sobre a Petrobrás, mas apenas registrar que a
má gestão - uma conduta totalmente reversível (e não necessariamente
criminosa, pois pode ser apenas uma variedade de burrice que nasce de
proposições ideológicas) - é responsável pela maior parte do prejuízo.
Novas bases para a gestão e a para orientação estratégica (e ele faz
diversas recomendações óbvias e interessantes) fariam a empresa
recuperar vários bilhões em valor em pouco tempo, o que transformaria o
dinheiro da corrupção em café pequeno e ajudaria, inclusive, a
negociação de indenizações.
Mas, em vez de prestar atenção no que
diz o guru, tal como César, Dilma rejeita a cautela e o bom senso, e
mantém a empresa na mesma senda que a levou ao buraco. Trazer Joaquim
Levy foi um grande progresso, mas manter a Petrobrás sob a órbita do PT
foi uma maneira de estabelecer os limites. Se foi a proverbial teimosia
ideológica, tanto pior, mas se não havia alternativa, então é para nos
preocuparmos de verdade com os idos, que podem ser de maio, julho e
outubro, ou dos outros meses, quando cai no dia 13.
FONTE AVARANDABLOGSPOT
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