editorial de O Globo
PT ressuscita discurso da década de 50, quando o petróleo era ‘nosso’, mas continuava debaixo da terra. Agora, sem mudança de modelo, ele ficará no fundo do mar
O direito a espernear, o jus sperniandi, é
livre. Diante de fatos consumados, a parte contrariada por uma decisão
judicial consistente não deixa de reclamar. Aplicado à política, porém, o
princípio do esperneio pode levar a situações bizarras e até mesmo a
tensões desnecessárias.
Os desdobramentos do petrolão, já configurado como o maior caso de
corrupção de que se tem notícia na história brasileira, vão por esse
caminho, devido à estratégia de defesa do PT.
Era esperado que o partido reagisse. Afinal, sofre avarias proporcionais
à dimensão da roubalheira. Também não surpreende que volte a empregar o
truque usado no mensalão do que “todos fazem”. No atual escândalo, o
partido usa trecho do depoimento do ex-gerente da Petrobras Pedro
Barusco, no qual ele confessa ter recebido propina desde 1997, para com
isso identificar no governo tucano de FH a origem de todo o mal. Tese
sintomaticamente adotada pela presidente Dilma.
Cabe registrar que também é parte do mesmo testemunho de Barusco a
revelação de que o PT teria levado, desde 2003, entre US$ 150 milhões e
US$ 200 milhões de propinas garimpadas em negócios na Petrobras. Dessas
enormes cifras, o tesoureiro do partido, João Vaccari Neto, ficara
responsável pela coleta de parcela considerável.
Ansioso para sair do imobilismo catatônico de que foi vítima, na
sucessão de revelações graves feitas no petrolão, o partido já se
prepara para pedir à nova CPI da Petrobras que investigue esta denúncia.
Ora, não se duvida que a corrupção na Petrobras tem longa história, mas
nunca se soube de um esquema institucionalizado, vinculado ao partido
no poder, e de escala industrial, como o petrolão.
Outra manobra em curso é traçar um cenário pré-64, algo delirante, e
colocar no centro dele a Petrobras como vítima de entreguistas,
interessados em aproveitar o escândalo para surrupiar as reservas de
pré-sal do país. A ponta visível dessa operação política é o manifesto
de um grupo de intelectuais redigido para denunciar a “campanha para
esvaziar a Petrobras”, e “entregar o pré-sal às empresas estrangeiras,
restabelecendo o regime de concessão.”
Lembre-se que a descoberta do pré-sal foi usada para se instituir o
modelo de partilha, o monopólio da estatal sobre a operação na área,
conceder-lhe compulsoriamente 30% dos consórcios e estruturar-se um
megalomaníaco programa de substituição de importações de equipamentos,
também usado pela indústria de propinas do petrolão. Se a Petrobras, em
condições normais, já tinha dificuldades para tocar esse plano de
pedigree “Brasil Grande”, agora é incapaz de mantê-lo. Não tem caixa nem
crédito para isso. Não há como sustentar o modelo.
O PT, ao reagir ao petrolão, ressuscita um discurso da década de 50 e
recoloca o Brasil na situação de antes da assinatura dos contratos de
risco, no governo Geisel: o petróleo era “nosso”, mas continuava debaixo
da terra. Agora, do mar.
FONTE ROTA2014
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