editorial de O Globo
A falta de condenação explícita da escalada da repressão do regime de Nicolás Maduro pelo governo Dilma denuncia dois pesos e duas medidas na diplomacia brasileira
Chama atenção o silêncio do Brasil diante da escalada da repressão
praticada pelo regime bolivariano da Venezuela contra a oposição. Desde a
reação truculenta aos protestos do ano passado, que deixaram 45 pessoas
mortas, à prisão sem mandado judicial do prefeito de Caracas, Antonio
Ledezman, na última quinta-feira, o governo brasileiro vem sendo cobrado
a se posicionar sobre a questão, mas reage com um protocolar silêncio,
sob a justificativa de “não interferir em assuntos internos" de países
vizinhos.
Esta posição, porém, não se sustenta quando se examina, entre outros
exemplos, a rápida reação da diplomacia brasileira na suspensão do
Paraguai do Mercosul, na ocasião do impeachment do ex-presidente
Fernando Lugo, em 2012. A medida, embora controversa politicamente,
possuía fundamento jurídico, pois estava embasada na Constituição
paraguaia. Apesar disso, liderados pelo Brasil, os membros do Mercosul
que compartilham de alguma maneira a ideologia bolivariana aprovaram a
suspensão do Paraguai. O afastamento do país foi primordial para a
entrada da Venezuela no bloco sul-americano, pois sua adesão enfrentava
forte oposição de Assunção.
Ledezman foi preso por cerca de 50 agentes do Serviço Bolivariano de
Inteligência Nacional (Sebin), numa ação violenta, em que seu gabinete
terminou invadido a tiros, e o prefeito, levado para um centro militar,
sob a acusação de conspirar para derrubar Maduro.
A ação contra Ledezman se baseou, soube-se depois, em denúncia de um
militar aposentado feita sob tortura, e com vários indícios de ter sido
forjada. Ontem, enquanto membros do ABP, partido do prefeito, eram
impedidos de visitá-lo na prisão, agentes do Sebin e da Guarda Nacional
Bolivariana (GBN) invadiram a sede do Copei, outro partido da oposição.
A escalada da violência contra a oposição gerou protestos de países
vizinhos, como Chile e Colômbia, além dos EUA, acusados por Maduro de
tentarem desestabilizar o regime. A subsecretária de Estado americana
para a América Latina, Roberta Jacobson, disse estar profundamente
preocupada com o acirramento da repressão na Venezuela.
Já o Ministério de Relações Exteriores do Brasil divulgou nota,
afirmando que acompanha “com grande preocupação a evolução da situação
na Venezuela”, sem sequer mencionar a prisão de Ledezman. A nota também
aponta os esforços no âmbito da Unasul, que prometeu enviar uma missão à
Venezuela “para avaliar a situação”. Um dia após a prisão de Ledezman, a
presidente Dilma Rousseff concedeu, numa cerimônia em Brasília,
credenciais à nova embaixadora venezuelana, Maria Lourdes Urbaneja
Durant. Indagada sobre a escalada de violência, Dilma disse não poder se
intrometer em questões internas do país.
A não condenação da repressão na Venezuela, cuja violência é
proporcional à queda da popularidade de Maduro, deixa o governo do PT na
deplorável posição de cúmplice de um regime que caminha para ser uma
ditadura.
FONTE ROTA2014
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