por Paulo Guedes O Globo
Barbosa e Moro decretam o fim da impunidade para os donos do poder: exige-se a legalidade das práticas além
O pacto pela impunidade está rompido. Os donos do poder não estão mais
acima das leis. A transparência de uma sociedade aberta assusta mentes
retrógradas que se habituaram à subserviência e à impunidade entre os
poderes constituídos. O antigo regime militar havia moldado cínica
harmonia entre esses Poderes. Espúrias alianças políticas entre
despreparados social-democratas e conservadores oportunistas evitam as
necessárias reformas. O resultado é uma desconcertante degeneração da
política numa gigantesca teia de corrupção.
A presidente Dilma Rousseff estaria ameaçada pelas pedaladas fiscais, e
sua chapa com o vice-presidente, por suposta ilegalidade no
financiamento da campanha. Os presidentes do Senado e da Câmara podem
estar envolvidos no escândalo de corrupção apurado pela operação
Lava-Jato. E estariam todos dispostos a usar suas lanças e escudos
institucionais uns contra os outros. Estaríamos diante do caos,
perturbando a idílica harmonia anterior? Ou, ao contrário, pelo
esgotamento das degeneradas práticas que nos levaram a uma situação
caótica, estamos no limiar de um período de mudanças para o
aperfeiçoamento de nossas instituições?
O Executivo e o Legislativo poderiam ter conduzido um processo
evolucionário de reformas na política. Mas, por sua omissão, coube ao
Poder Judiciário a condução de um processo revolucionário de
aperfeiçoamento institucional. É um formidável exemplo das enormes
transformações que boas lideranças podem promover sobre a vida do país. O
exemplar comportamento republicano de Joaquim Barbosa e Sergio Moro
decretou o fim da era da impunidade e o início de uma época que exige a
legalidade das práticas políticas, além da legitimidade conferida pelas
urnas.
Mas o esforço apenas do Poder Judiciário pode não ser suficiente. “Há na
política, como na Igreja, dois elementos inconciliáveis que não cessam
de se chocar: a missão espiritual superior e os desvios de suas práticas
profanas. O bem e o mal são intrínsecos a ambas.
Os Poderes e as instituições não estão hoje deslegitimados apenas porque
caíram na ilegalidade. A ilegalidade é também generalizada porque os
Poderes perderam a consciência do que representa sua legitimidade”,
registra o filósofo italiano Giorgio Agamben, em “O mistério do mal”
(2014).
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