por Vinicius Mota FOLHA DE SÃO PAULO
O principal fato político da crise brasileira é a derrocada do poder
presidencial. Desapareceu num chofre a capacidade de Dilma Rousseff de
liderar a agenda pública, de pautar o Congresso e de angariar apoio para
suas prioridades.
Um arranjo emergencial e acidental improvisou-se em seu lugar. O trio
peemedebista Temer, Calheiros e Cunha avançou ao proscênio. Um ministro
da Fazenda independente do petismo, incumbido de inverter o curso da
política econômica, posicionou-se logo atrás.
A cristalização do esquema alternativo de partilha, em abril, iludiu
analistas, que tomaram por duradouro um alívio circunstancial e
relativo. Esse amálgama de governança desde o início estava prenhe de
instabilidade, o que logo se escancarou.
O tiro no peito do presidente da Câmara foi apenas o mais recente
episódio da nova espiral da crise. Como no desenrolar de Hamlet, a trama
empurra as principais personagens para a insânia e a destruição mútua.
Estarão todos mortos ao final, a ponto de o autor ter de escalar alguém
de fora para recolher os cadáveres?
O que a vivência de seis meses de crise parece mostrar, consoante com a
herança depurada de 125 anos de regime republicano no Brasil, é que nada
chega perto de preencher a lacuna deixada por um presidente da
República enfraquecido.
Se realmente está convencida de que não vai cair, Dilma Rousseff deveria
ter o discernimento necessário para romper com os atores hamletianos
desse enredo, a começar de Lula e do PT. Ela precisa anular-se
definitivamente como vetor eleitoral e partidário para ter chance de
restaurar algum poder presidencial.
Há gestos que a presidente pode fazer nesse sentido, como reformar seu
gabinete, enxugar a administração direta, desfiliar-se de seu partido e
abrir diálogo institucional que inclua o ex-presidente Fernando
Henrique. Depende apenas dela.
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