Mario Cesar Carvalho
Folha
“Annus horribilis” –expressão em latim que significa, como se imagina, “ano horrível”– é pouco para definir o que aconteceu com a Petrobras em 2014. Pela primeira vez na história do país, dois ex-diretores da petroleira foram presos sob acusação de receber propina de fornecedores. Pela primeira vez, mais de 20 dirigentes de empreiteiras foram presos.
Pela primeira vez, o que se dizia à boca-pequena foi vocalizado por um ministro do Superior Tribunal de Justiça e pelo procurador-geral da República: “roubalheira”, cenário “desastroso”, assalto.
Pela primeira vez, também, um integrante da cúpula da petroleira, o ex-diretor Paulo Roberto Costa, falou que os contratos eram superfaturados, e que o valor a mais virava suborno, distribuído a políticos e servidores.
O que triturou a imagem da empresa, apontada pelo ex-presidente Lula como aquela que mudaria o futuro do Brasil com o pré-sal, foi a Operação Lava Jato da Polícia Federal –além, é claro, da gestão desastrosa da estatal.
DOLEIRO DE PROVÍNCIA
O que parecia inicialmente uma investigação da PF sobre um doleiro de província, Alberto Youssef, que iniciara seu trabalho em Londrina (PR), acabou virando uma ameaça para políticos como o presidente do Senado, Renan Cavalheiros (PMDB-AL), citado por delatores entre os beneficiados do esquema. A lista de envolvidos deve ultrapassar 50 parlamentares do PT, do PMDB e do PP, sobretudo.
Há alguns indícios de que os desvios da Petrobras substituíram o mensalão, esquema de financiamento da base de apoio do PT na Câmara dos Deputados, revelado pela Folha em junho de 2005.
ESCALA DE VALORES
Se os dois esquemas têm alguma semelhança no modus operandi (contratos superfaturados dos quais saíam recursos para o suborno), há um abismo a separar a escala de valores. No mensalão, a propina era retirada de contratos de publicidade de R$ 130 milhões. Na Petrobras, só duas das obras investigadas, a refinaria Abreu e Lima e o Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro, custaram mais de R$ 200 bilhões, o equivalente a 1.500 vezes a base financeira do mensalão. Os desvios são estimados em R$ 11 bilhões.
Essas cifras superlativas talvez ajudem a explicar por que a Petrobras foi a companhia que mais se desvalorizou no governo Dilma (2011-2014), segundo estudo de uma consultoria. Seu valor caiu de R$ 380,2 bilhões para R$ 179,5 bilhões, uma sangria de R$ 200 bilhões. “Annus apocalyptus” talvez seja a melhor definição para o 2014 da estatal.
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