por PERCIVAL PUGGINA
A execução de um traficante brasileiro na Indonésia trouxe a
aplicação desse tipo de pena à pauta nacional. É impossível fazer de
conta que o assunto não existe. Existe sim e é importante pensarmos
sobre ele.
A pena de morte é moralmente aceitável? Como católico,
recorro com segurança e convicção à tradicional doutrina da Igreja. O
que ela me ensina a esse respeito? Ensina que sob o ponto de vista
moral, há enormes distinções entre a dignidade do agressor e a dignidade
do agredido, entre a situação concreta do inocente e a do culpado.
Também ensina que deve existir uma proporcionalidade entre a agressão e a
respectiva reação. Me diz que isso vale tanto para o conflito entre
dois indivíduos, quanto para a situação em que um indivíduo fere o bem
da sociedade. Mantém-se igualmente aqui o princípio da
proporcionalidade.
Ora, o tráfico de drogas é a ação criminosa
que responde pelo maior número de mortes violentas no Brasil. Apela para
métodos infames de sedução, atingindo muito preferencialmente a
juventude, no momento de aprendizado do exercício da liberdade
individual. A partir daí, a droga passa a afetar as decisões do
dependente e desencadeia um verdadeiro terremoto nas relações familiares
e sociais. O traficante faz, de cada vítima, uma caixa de Pandora
aberta, a semear males pelo mundo. O tráfico é usina a gerar tragédias, a
produzir cadáveres. E a povoar de zumbis as cracolândias. Essa
atividade criminosa disputa com o terrorismo, e por enquanto vai
vencendo, a título de maior mal do século 21.
O Catecismo da Igreja Católica, quando trata da pena de morte, no nº 2267, afirma que "se
os meios incruentos bastarem para defender as vidas humanas contra o
agressor e para proteger a ordem pública e a segurança das pessoas, a
autoridade se limitará a esses meios, porque correspondem melhor às
condições concretas do bem comum e estão mais conformes à dignidade da
pessoa humana". No entanto, ainda no mesmo nº 2267, esclarece que "a Igreja não exclui, depois de comprovadas cabalmente a identidade e a responsabilidade de culpado, o recurso à pena de morte, se essa for a única via praticável para defender eficazmente a vida humana contra o agressor injusto".
São João Paulo II, na encíclica Evangelium Vitae, nº 56, ensina: "Claro
está que, para bem conseguir todos estes fins, a medida e a qualidade
da pena hão de ser atentamente ponderadas e decididas, não se devendo
chegar à medida extrema da execução do réu senão em casos de absoluta
necessidade, ou seja, quando a defesa da sociedade não fosse possível de outro modo.
Mas, hoje, graças à organização cada vez mais adequada da instituição
penal, esses casos são já muito raros, se não mesmo praticamente
inexistentes".
Pois bem, se há algo tão comprovado quanto a
plural malignidade do tráfico de drogas é a impotência do sistema penal
para reprimi-lo através do encarceramento dos traficantes. Ou os grandes
traficantes, desde o interior dos estabelecimentos penais, dão
continuidade a seus negócios, ou as sucessões de comando preservam a
atividade das organizações criminosas.
Por tudo isso, considero
perfeitamente justificável, perante o ensino moral da Igreja, a
aplicação da pena de morte ao crime de tráfico de drogas no Brasil, sem
desconhecer, é claro os impedimentos taxativos impostos pelo irrealismo
da Carta de 1988.
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