por José Neumanne O Estado de São Paulo
Presidente, que se acha economista, manda e desmanda. Levi, que o é,
pensa que tem a força.Dilma Rousseff não sabe o que perdeu deixando de
ir ao Fórum Econômico Mundial, em Davos. Pois, não indo, não teve a
chance de ouvir o primeiro-ministro da Itália, Matteo Renzi, pedir aos
governantes coragem para mudar, para reformar. “Há uma janela e um
período de oportunidade excepcional e o papel dos políticos é atender o
momento, carpe diem,
em que podemos escolher o futuro”, disse ele. Ela preferiu comparecer à
posse do cocalero Evo Morales na presidência da Bolívia a aprender com o
europeu o óbvio ululante de que para decepar os nós górdios da economia
há que antes reduzir os ônus da política.
Nos Andes, ela ouviu o colega vizinho asseverar com franqueza: “Na
Bolívia, não mandam os ‘Chicago boys’”. Enquanto isso, nos Alpes, um
“Chicago boy” da melhor estirpe, o ministro da Fazenda dela, Joaquim
Levy, vulgo “mãos de tesoura”, encantou o chamado mercado neocapitalista
mundial por sua coragem de dar notícias ruins aos cidadãos brasileiros,
mal eles foram expulsos da Disneylândia eleitoral dos petralhas.
Enquanto o subordinado gozava seus cinco minutos (talvez de dois a três
anos) de poder e glória, a chefe saboreava sua volta à segurança da
clandestinidade. Depois de um ano inteiro prometendo ao Zé Mané mundos e
fundos para arrebanhar votos, sob os auspícios do marqueteiro João
Santana (o poeta Patinhas do Bendegó), nada como fugir para um lugar
onde não tinha de explicar que era tudo “mentirinha de marketing”. Sem
deixar de aplicar os beliscões de praxe para mostrar quem manda.
Levy é economista e pensa que tem a força. Dilma, que se acha
economista, é que manda e desmanda. Manda quem pode, quem tem juízo
obedece. No palanque, ela jurou que devolveria os excessos
inflacionários tungados do contribuinte no Imposto de Renda. À sombra e
água fresca do palácio, vetou a correção de 6,5% para facilitar a tarefa
de tirar R$ 20 bilhões desviados da Petrobrás para partidos, incluindo o
dela, do bolso do cidadão que, sem padrinho, morre pagão.
Em Davos, Christine Lagarde, diretora-gerente do Fundo Monetário
Internacional (FMI), encheu a bola do ministro brasileiro apoiando suas
“medidas impopulares”. Fê-lo antes de Dilma, que só aprovou o
subordinado em público na reunião ministerial de ontem. Com isso, o
Partido dos Trabalhadores (PT) teve tempo para imitar o
“multipresidente” Ulysses Guimarães, que dava as cartas no governo
Sarney enquanto liderava a oposição. A candidata jurou de pés juntos que
não daria cabo de nenhuma conquista dos trabalhadores. A presidente
repetente mandou escrúpulos e promessas às favas, dificultando o acesso
ao seguro-desemprego, quando há indícios de risco para o emprego.
Alérgica à política, jejuna em contabilidade e avessa a economizar, a
presidente não deu explicações satisfatórias da traição à classe
operária. Mas seus áulicos tentaram minimizar os efeitos deletérios da
falseta assegurando que as conquistas dos trabalhadores não foram
afetadas porque a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) não foi
alterada. Falácia cínica! A CLT não é uma “conquista dos trabalhadores”,
mas uma concessão do ditador Getúlio Vargas ao operariado para
manipulá-lo a seu bel-prazer utilizando pelegos. Encarregado de
consertar a lambança, Levy tentou dar sua contribuição teórica à
tentativa de logro dela, assegurando: “O seguro-desemprego é um
benefício ultrapassado”. Será? Pode até ser, mas isso nada tem que ver
com a tunga. E, além de também ser outra falácia cínica, permitiu que
ela lhe mostrasse que elogios de Lagarde não bastam para garanti-lo no
cargo.
Só agora ela saiu da clandestinidade, mas ficou no palácio, para dizer a
seus 39 ministros que teve de permitir a um auxiliar egresso da
oposição que corte gastos com dor para manter seus programas sociais.
Mas nunca pediu desculpas ao cidadão que votou nela e paga a conta pelo
óbvio malogro.
Joaquim Levy era da segunda divisão da assessoria econômica do tucano
Aécio Neves, derrotado por ela na eleição. O chefe dessa assessoria,
Armínio Fraga, fez eco a Lagarde ao dizer que o ex-companheiro é “uma
ilha no mar de mediocridade” que é o segundo governo Dilma. Se
verdadeira, a afirmação traz uma boa e uma má notícia. A boa é que, como
o governo anterior foi o pior de todos os tempos, dificilmente o atual
terá como superá-lo em mediocridade. A ruim é que é mais provável que
piore, sim!
O ex-ministro de Minas e Energia Edison Lobão, por exemplo, nunca
condicionou à duvidosa brasilidade de Deus a chuva no sertão que virou
país. Ou terá sido este país que virou sertão, eis a questão. Pelo
visto, Lobão foi à aula de Geografia em que foi ensinado que Nordeste é
Brasil e em muitos anos não chove no semiárido, apesar das súplicas dos
sertanejos a São José, que criou o filho do Próprio. O devoto amazonense
Eduardo Braga, que espera a interferência divina para pôr fim à “crise
hídrica”, foi substituído na tarefa de pedir à população que aguente a
falta de luz e água com resignação, e que devia caber a Dilma, pela
ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, ainda mais insignificante
do que ele.
Nossa presidente não foi a Paris repudiar o terror nem consolou os pais
de Alex Schomaker, morto por bandidos no Rio. Mas criou uma crise
diplomática porque a Indonésia fuzilou o traficante Marco Archer.
Ressuscitou os lemas fascistoides “alma coletiva” e “pátria educadora”,
mas cortou R$ 7 bilhões no orçamento da Educação quando 500 mil jovens
tiraram zero na redação do Enem, acesso a um ensino superior cada dia
mais inferior. Ela falha e não se manca; e quanto mais erra, mais
desmandos pratica. Reuniu o Ministério para desejar um feliz “dois mil e
cinzas” negando o que prometeu e prometendo mais do mesmo sem oferecer
garantias de que o fará. Devia aprender com Churchill, morto há 50 anos,
que a dar só tem “sede, suor e trevas”. Foi o que Renzi ensinou na
Suíça.
fonte rota2014
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