Ruy Fabiano:Com Blog do Noblat - O Globo
A política brasileira continua refém da polícia. A prisão de Eduardo
Cunha reabriu o leque de especulações punitivas, que vão de Lula a
Michel Temer.
A caixa preta de Cunha é a porta de entrada da Lava Jato no PMDB,
sucessor e velho parceiro do PT, no poder e no delito – sobretudo no
delito.
Mas não é só Cunha, claro.
Há múltiplas delações premiadas em curso, de empresários, doleiros e
operadores, algumas já concluídas, acrescentando novos dados e
personagens aos crimes de rapina, perpetrados ao longo dos últimos 13
anos e meio contra o Estado brasileiro.
Não se sabe o que daí ainda virá, mas sabe-se que a Lava Jato está longe
de seu fim, e recentemente obteve prorrogação de um ano em suas
investigações. Mas o que se sabe já convulsiona a República.
Há, entre os infratores, além da cúpula do governo anterior, personagens
que, nesse período, figuraram na oposição (tucanos, inclusive), e ainda
os que estavam e continuam na situação – isto é, gente do PMDB. Tudo
isso, claro, gera instabilidade política, com reflexos na economia. Quem
quer investir num campo minado?
A hipótese de Michel Temer vir a ser atingido direta ou indiretamente
por essas revelações não é remota. Já teve de demitir ministros e é
possível que haja outros na fila. Como se não bastasse, há o processo
contra a chapa eleitoral em que figurou ao lado de Dilma. O ministro
Luiz Fux, do STF, considerou possível que, no processo em curso no TSE,
Temer possa se dissociar de Dilma.
A jurisprudência, no entanto, vai em sentido contrário, o que daria ao
fatiamento das campanhas um selo de casuísmo, enfraquecendo ainda mais a
autoridade moral do atual presidente, que ainda corteja sem êxito a
simpatia da opinião pública.
O legado econômico do PT é devastador. A PEC 241, que estabelece o teto
de gastos públicos, nada mais é que o retorno à lógica contábil, em que
só se gasta o que se tem. E é um desafio ao gestor, que terá de
estabelecer o que de fato é prioridade.
Se, por exemplo, estivesse em vigor no início do governo Dilma, o Brasil
não teria promovido nem a Copa do Mundo, nem as Olimpíadas, a menos que
as considerasse (como as considerou) mais prioritárias que educação,
saúde, segurança, programas sociais, obviamente prejudicados por gastos
adicionais nada modestos.
O resultado aí está: R$ 170 bilhões de déficit no orçamento do próximo
ano, 12 milhões de desempregados e milhares de empresas fechadas. Não
basta, porém, dar racionalidade às contas. É preciso que o governo
sinalize com alguma estabilidade. E é impossível fazê-lo quando abriga
ainda gente sob suspeita, alguns já citados nas investigações policiais.
O país quer tanto a estabilidade quanto o saneamento moral de sua
classe dirigente.
No momento, porém, essas coisas colidem - e não há como excluir uma em
favor da outra. A prisão de Cunha não terá resultados imediatos. É óbvio
que ele irá delatar, já que não pretende ver mulher e filha presas, nem
passar o resto da vida na prisão.
Mas a delação é precedida de negociações, em que o delator tem de provar
a utilidade do que delatará. Cunha chega com a maior parte de sua
história já conhecida. Mas a parte que resta, e que envolve nomes
graduados, pode fazer a diferença.
Resta saber o que ele está disposto a contar. E aí a Praça dos Três
Poderes balança. Ele é não apenas um arquétipo do político brasileiro
contemporâneo, mas alguém que se tornou íntimo das altas esferas do
poder, desde os tempos de Collor de Mello.
Lidou com a esquerda, a direita, o subsolo e a sobreloja. Foi sempre um
personagem de segundo escalão, alçado ao primeiro exatamente por quem
mais hoje o critica: o PT.
Sua prisão foi vista como preâmbulo à de Lula, o que não é
necessariamente verdade. A situação de Lula envolve outro roteiro, cujo
timing só a Força Tarefa conhece, mas cujo conteúdo foi antecipado na
célebre entrevista dos procuradores, há um mês.
Lula foi considerado chefe da organização criminosa que promoveu o
assalto à Petrobras e a outras estatais em mais de duas décadas de
exercício do poder. Cunha é peixe pequeno diante disso. O que têm em
comum é uma conversa agendada com o juiz Sérgio Moro, em que o veículo
disponível é um camburão. Cunha já foi.
extraídaderota2014blogspot
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