Ferreira Gullar:
Sempre tive simpatia por Eduardo Suplicy, muito embora ele pertença ao
Partido dos Trabalhadores. Mas também tive simpatia por esse partido.
Muitos anos atrás, melhor dizendo, quando ele foi fundado, em 1980.
Naquela época, eu militava no Partido Comunista Brasileiro (PCB), que
não viu com bons olhos a criação do PT. Menos pelo partido do que por
ter, como figura principal, Luiz Inácio Lula da Silva. Os dirigentes do
PCB não confiavam nele por saber de sua atuação à frente do sindicato
dos metalúrgicos do ABC.
Mas eu argumentava: se não conseguimos mobilizar a classe operária para a
luta política, deixemos pelo menos que alguém o faça. Mais ou menos
assim pensavam também Mário Pedrosa, Antonio Cândido, Sérgio Buarque de
Holanda, entre outros intelectuais de esquerda.
Alguns deles, anos depois, retirariam seu apoio ao PT, como foi o caso
de Hélio Bicudo, que seria um dos autores do pedido de impeachment
contra Dilma Rousseff.
Essas deserções tiveram as mais diversas causas e aumentaram depois que
Lula assumiu a Presidência da República, deixando claro seu propósito de
fazer toda e qualquer concessão para permanecer indefinidamente no
poder.
Já no que me diz respeito, bem antes disso já havia mudado de opinião
quanto ao papel que Lula e seu partido desempenhariam na vida política
brasileira. O PCB tinha razão quanto à figura de Lula e seu futuro
desempenho à frente do PT e de seus propósitos chegando à chefia do
governo.
Isso tornou-se evidente quando, em seu primeiro mandato, rejeitou a
aliança com o PMDB –ao qual teria que fazer concessões– para, em vez
disso, comprar, com o mensalão, os deputados de partidos menores.
Tudo ficou claro com o escândalo do mensalão, que resultou na
condenação, pelo Supremo Tribunal Federal, dos principais auxiliares de
Lula: José Dirceu, José Genoino e Delúbio Soares. Lula fez que não sabia
de nada e contou com a lealdade dos companheiros para escapar ileso da
falcatrua.
Mas os escândalos maiores estavam por vir, conforme revelou a Operação Lava Jato.
Negociatas envolvendo bilhões de reais, grandes empreiteiras e políticos
do PT e de outros partidos atingiriam profundamente o prestígio de Lula
e de seu partido, como ficou patente, agora, com o resultado das
eleições municipais.
Apesar de tudo isso, mantive minha simpatia por Eduardo Suplicy, talvez
por ver nele um político idealista que, embora integrante do PT, nunca
se envolveu em negociatas nem usufruiu das propinas que enriqueceram
funcionários das estatais, políticos e partidos.
Ao contrário, Suplicy, durante toda a sua atuação, insistiu em defender
os interesses da população menos favorecida. Até hoje ele batalha pela
implantação da renda básica que beneficiaria milhões de trabalhadores.
Não por acaso, enquanto seu partido, nas últimas eleições, caía para
décimo lugar na quantidade de votos obtidos, ele, Suplicy, era o mais
votado dos vereadores do país.
Ao saber disso, fiquei contente por ver que muitas vezes o eleitor vota
com justiça e consciência. Mais uma razão para que me dispusesse a
assistir a entrevista que Suplicy concedera a Roberto d'Avila. Foi
quando o ouvi, mais uma vez, manifestar sua opinião sobre os problemas
da sociedade e as medidas que propunha para resolvê-los ou atenuá-los.
Mas eis que o entrevistador pede sua opinião sobre o governo de Michel
Temer.
A resposta de Suplicy me desapontou, pois, embora sabendo-o petista, não
esperava ouvir dele o que ouvia de todos os petistas: isso de que Temer
é um presidente ilegítimo, pois não foi eleito!
Mal acreditei no que ouvi. Como Temer não foi eleito se quem votou em
Dilma votou nele? Se ela obteve 54 milhões de votos, ele os teve também,
pois a chapa era uma só. Fora isso, o vice existe para substituir o
presidente, em caso de ausência ou impedimento. Logo a presença de Temer
à frente do governo é indiscutivelmente constitucional.
Lamento dizer que, desta vez, meu estimado Suplicy pisou na bola.
extraídaderota2014blogspot
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