Roberto Macedo: O Estado de São Paulo
Essa proposta de emenda constitucional (PEC) recentemente passou em
primeiro turno na Câmara dos Deputados. Na sua essência, estabelece um
teto para o aumento do total das despesas primárias do governo federal.
São as que excluem os juros da dívida – uma despesa enorme – e outros
encargos financeiros de menor magnitude. O teto se instalaria em 2017, e
determinado pelas despesas primárias pagas em 2016, incluídos restos a
pagar quitados, e demais operações que afetam o resultado primário,
corrigidas em 7,2%. A partir de 2018 a correção seria pela taxa do IPCA
no período de 12 meses encerrado em junho do ano anterior.
Em síntese, uma correção pela inflação, o que é um risco, pois a
arrecadação pode não aumentar tanto. Outro limite poderia ter sido a
taxa desse crescimento, a que fosse menor. Na discussão na Câmara, os
gastos em educação e saúde foram preservados de cortes, mas seus pisos
só poderiam aumentar em termos reais se reduzidas outras despesas.
Ainda que com imperfeições, a PEC é um inaudito e bem-vindo ajuste
fiscal pelas despesas. A prática usual era aumentá-las sem maior cuidado
e, até onde possível, financiadas por mais impostos e endividamento. No
período 2008-2015 as despesas primárias subiram 51% acima da inflação e
a receita, apenas 14,5%.
Em 2014 e 2015 a “gerentona” Dilma agravou muito o desequilíbrio, no
primeiro ano com gastança eleitoreira que levou então a um insólito
déficit primário. Ou seja, um em que o governo fica sem dinheiro até
para pagar parte dos juros de sua dívida, estes “honrados” com
endividamento adicional, assim como o déficit primário, o que se repetiu
com maior vigor em 2015 e 2016, ampliando fortemente a dívida pública.
As piores sequelas desse desastre vieram rápida e cumulativamente.
Disseminou-se o medo quanto a que poderia levar, como à insolvência do
governo, o maior ente da economia. Com isso se retraíram decisões de
investir e consumir, a economia entrou em recessão, caíram as receitas
tributárias e a situação ficou ainda pior.
O forte desequilíbrio fiscal foi o pecado e, agora, deve vir a PEC como
penitência. Quem o cometeu jamais o confessou. Pior, pecou novamente ao
mentir com sua narrativa de que nada fez de errado. E houve quem
acreditasse nessa conversa, alguns até se contorcendo para dar-lhe
frágeis fundamentos jurídicos. Desconforta saber que não é a primeira
vez na História, nossa e mundial, que pecados de governantes levam o
povo à penitência.
Pecado porque violou mandamentos da boa gestão financeira, pessoal,
empresarial ou governamental, em particular o que prega moderação nos
déficits orçamentários e no endividamento. Lembra também um pecado
capital, a gula, pois o que houve aqui dá razão ao que disse Ronald
Reagan, ex-presidente dos EUA: “O governo é como um bebê, um tubo
digestivo com grande apetite numa ponta e nenhum senso de
responsabilidade na outra”. Como nunca antes neste país, o nosso se
comportou como um bebê guloso de enormes dimensões. E sem trocar a
fralda.
Alternativas à PEC? Há quem ainda proponha aumentar impostos, mas mesmo
políticos que fizeram isso reconhecem que a carga tributária já é pesada
demais. E os “contribuintes”, a quem chamo de tributados, já sentem
isso e execrarão eleitoralmente quem optar por esse caminho.
Saudosistas da “nova política econômica”, que no governo Dilma balizou o
desastre fiscal, seguem inebriados por ideias de um famoso economista,
Keynes, que pregava mais gastos públicos para estimular economias em
recessão. Mas não aprenderam ou se esqueceram de que uma coisa é fazer
isso numa economia como a americana, cujo governo emite dólares, e com
dívida sob controle; aqui, esse caminho agravaria a recessão,
amedrontando ainda mais os consumidores, investidores e o mercado
financeiro nas suas avaliações e tomadas de decisões.
A PEC 241 diz ter como objetivo um novo regime fiscal, o que
sobre-estima sua amplitude e seu impacto. Para se credenciar como tal
precisaria ser seguida por outras medidas. A mais importante e urgente é
reformar a Previdência Social, pois com a população envelhecendo, e
várias distorções nos seus benefícios, suas despesas continuarão subindo
acima da inflação. Com o teto da PEC 241, outras precisariam ser
reduzidas, com novas distorções nos gastos.
Num autêntico regime fiscal novo, caberia corrigir várias outras
distorções. Entre elas, a excessiva concentração de recursos tributários
na União, a ausência de uma avaliação caso a caso de custos e
benefícios dos gastos públicos, os ínfimos investimentos públicos, o
excessivo peso dos impostos indiretos – como sobre produção e vendas,
que oneram com maior força os segmentos mais pobres da população –, os
supersalários no governo, vários privilégios tributários e o acesso a
serviços públicos por quem pode custeá-los, com nas universidades.
Como toda penitência, a PEC 241 também pode trazer outros benefícios,
pois deverá levar a uma grande reflexão sobre o que aumentar e o que
diminuir no contexto de um teto para o total das despesas primárias,
ensejando a correção de distorções fiscais como as citadas.
Mas existe um excesso delas e não há como arrumar várias numa mesma PEC.
Ademais, ampliar a 241 prejudicaria a sua urgência e só aumentaria o
exército de seus opositores. Assim, é melhor não mexer no seu texto e
lutar para que chegue rapidamente à promulgação. E que venham outras
medidas como as citadas.
Vivemos hoje um momento que lembra com esperança o que disse Winston
Churchill, em 1936: “Devido a negligências no passado, apesar de claras
advertências, entramos num período perigoso. A era da procrastinação, de
meias medidas, de atrasos que aliviavam e enganavam está chegando ao
final. No seu lugar, estamos adentrando um período de consequências. Não
podemos evitá-lo”.
extraídadearota2014blogpsot
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