por Luiz Paulo Pondé FOLHA DE SÃO PAULO
Tem muita gente com medo dos evangélicos. Acho que deve ser trauma de
infância. Talvez essa gente tenha sofrido na escola bullying de algum
evangélico mais forte ou de alguma evangélica mais bonita.
A tentativa de criar uma lei multando quem fizesse piada com ícones
religiosos (leia-se Jesus) deixou os inteligentinhos com medinho.
O assunto é sério. Primeiro, deixo claro que sou contra essa lei. E
mais: sou contra toda e qualquer forma de proibição sobre o humor. Mas
aqui é que a coisa pega.
Os inteligentinhos só defendem a liberdade de expressão no que interessa a eles.
Por isso, quando reclamam contra essa lei absurda, soa "fake". Vou explicar o porquê de soar "fake".
Óbvio: a falha nos inteligentinhos não é intelectual, mas ética.
Sócrates já nos ensinou que o problema do conhecimento é, antes de tudo,
ético. Para ele, saber é descobrir a própria ignorância. Quanto mais
sei, mas sei que nada sei. É a atitude ética que define o sujeito do
conhecimento na maiêutica socrática. Mas voltemos a coisas mais
mundanas.
Lembremos o que muitos inteligentinhos corretinhos falaram quando
aconteceu a tragédia do jornal francês "Charlie Hebdo" em janeiro.
Na época, os bonitinhos disseram coisas como: os cartunistas não
respeitaram "o outro". Adoro excepcionalmente essa coisa do "outro".
Disseram também coisas como: só se pode fazer piadas com opressores. Ao
longo dos anos fui percebendo que uma das maiores falhas de caráter hoje
em dia, no que se refere ao debate público, é gente que sempre coloca
essa coisa de "oprimidos x opressores" quando vai analisar o mundo.
Gente séria não usa isso como argumento. Em 200 anos rirão desse
argumento. Outros disseram que a função da mídia é proporcionar a vida
harmoniosa entre as diferentes culturas.
Mas, se isso for a missão da mídia (eu não concordo, acho essa ideia uma
forma de censura sem vergonha travestida de bom mocismo), então por que
proibir piadas com Jesus estaria errado? Por que não se deve "provocar"
os muçulmanos, mas pode-se "provocar" os cristãos?
Quer dizer que piadas com Jesus tá valendo, mas com o profeta não?
Claro, o cristianismo é o "opressor" e blablablá. Eis a evidência máxima
da incoerência de quem critica piadas com o islamismo, mas acha que
tudo bem piadas com o cristianismo.
Minha hipótese é mais embaixo: bonitinhos são normalmente medrosos e,
por isso, têm medo (com uma certa razão) do islamismo, porque essa
moçada não vota no PSOL e não "cobra multa" para quem ofender o profeta.
Há mais um problema a ser analisado nesse assunto. Há anos, inclusive
entre nós no Brasil, criou-se a moda de processar humoristas e proibir
piadas com X e Y (não vou citar grupos porque a maré não está para
peixe).
Os evangélicos apenas estão aprendendo a se mover no mundinho da censura
travestida de "direitos" e "dignidades". Perceberam que há uma
tendência puritana no mundo e estão querendo pegar carona no papinho dos
"direitos a dignidade".
Quem é contra piadas com X e Y ou quem acha que devemos respeitar os
ícones islâmicos não tem moral para se posicionar contra qualquer
tentativa de proibir piadas com Jesus. Pelo contrário, deveria ser
completamente a favor de qualquer lei que proíba piadas com Jesus.
Mas aqui surge a última questão: o fato é que os bonitinhos acham legal
falar mal do cristianismo porque se movem por meio de argumentos do tipo
"piadas só com os opressores", e, com isso, garantem seu mercado
particular de piadas, mas complica o mercado dos outros.
"Follow the money" sempre é uma boa ideia para descobrir motivações
escondidas. Principalmente quando tratamos com gente que trabalha
"contra a opressão".
Preste atenção numa coisa: quando alguém disser que faz alguma coisa por
alguma razão superior a dinheiro, saiba que ela faz o que faz, antes de
tudo, por dinheiro. Mesmo que seja apenas para evitar que você ganhe
dinheiro.
Acho uma lástima que a arte, a filosofia e as ciências humanas
resolveram "construir um mundo melhor". A hipocrisia, então, se oferece
como virtude.
Todos perdemos.
EXTRAÍDADEROTA2014BLOGSPOT
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