por Eliane Cantanhêde O Estado de São Paulo
Acena mais lancinante da semana não partiu do Planalto, nem do
Congresso, nem das Bolsas, nem do mercado de câmbio, mas de um hospital
público da Capital da República, onde um médico negou atendimento a um
moribundo, recebeu voz de prisão de um bombeiro e entrou em surto,
gritando desesperadamente: “Estou estressado. Tá faltando tudo, tá
faltando tudo. Eu quero sumir daqui!”.
Pois foi nesta mesma semana que a presidente Dilma Rousseff jogou o
Ministério da Saúde para as hienas do PMDB na Câmara. O vice-presidente
Michel Temer, o deputado Eduardo Cunha e o senador Renan Calheiros
vazaram para a imprensa a versão de que tinham se recusado a sugerir
nomes para a reforma ministerial de Dilma. Ato contínuo, o partido se
jogou de corpo e alma no festim para devorar nacos de poder enquanto o
governo ainda respira.
O ex-presidente Lula tenta negar, mas ele defendeu esse troca-troca numa
reunião com Dilma e o núcleo duro petista do governo e usou até uma
versão mais objetiva do conhecido “vão-se os anéis, salvam-se os dedos”.
Segundo Lula, “é melhor perder ministérios do que a Presidência”. Mas
logo o Ministério da Saúde?!
Para piorar, os nomes apresentados pelo PMDB à presidente são chocantes.
O deputado Manoel Júnior votou em Aécio Neves em 2014 e acaba de
defender a renúncia de Dilma. O deputado Celso Pansera é aquele que o
doleiro Alberto Yousseff chama de “pau mandado do Eduardo Cunha”. E vai
por aí afora.
Sem contar a intrigante escolha do ministério que, no butim, vai caber
ao PMDB do Senado. Dilma ofereceu a cabeça do ministro Armando Monteiro,
ops!, ofereceu o Desenvolvimento, mas a bancada do partido preferiu
Integração Nacional, que distribui verbas para os governadores. E quem é
governador? O filho do presidente do Senado, Renan Calheiros, aquele
que “se recusou a indicar nomes...”
Nada poderia ser mais dramaticamente sintomático da perda de poder
político de Dilma Rousseff, que não consegue nem o básico: fechar o
Orçamento, equilibrar as contas, aprovar o coração do ajuste fiscal,
concluir a reforma ministerial e anunciar o tão prometido corte de
pastas. Ela está totalmente nas mãos do PMDB. E que PMDB!
No programa que foi ao ar ontem à noite na TV, o principal partido da
base aliada usou imagens quase sombrias e um tom de oposição em campanha
eleitoral. O recado foi claro: o fim do “estrelismo”. E o foco foi em
cima de Temer, o substituto natural e constitucional de Dilma em caso de
vacância de poder.
Tem-se, assim, que Dilma entrega anéis e ministérios, mas nem por isso
garante que vá salvar os dedos e a Presidência. O Congresso lhe deu uma
vitória ao manter 26 dos 32 vetos presidenciais e está a caminho de
aprovar os restantes, mas essas votações têm uma dinâmica própria, pois
evitam implodir de vez as contas públicas. E agora? Dilma vai de fato
conquistar os votos do PMDB? Ela tem condições de aprovar a criação da
CPMF, coração do pacote fiscal? Consegue impedir a abertura do processo
de impeachment?
E mais: a presidente só tem 7% a 8% de aprovação, as greves pipocam por
toda a parte, o MTST põe as manguinhas de fora e lê-se que até o líder
do PT já grita como oposição. Dar a Saúde para o “baixo clero” do PMDB
não assegura a lealdade do partido nas decisões de vida ou morte e,
ainda por cima, tende a tirar ainda mais apoio de Dilma na opinião
pública e na sua base social.
A boa notícia para o Planalto é que, se as cenas dantescas dos
peemedebistas devorando a carniça no Planalto são péssimas para Dilma,
não se pode dizer que sejam animadoras para o PMDB. Elas não apenas
destroem o que resta de popularidade do atual governo como esgarçam de
véspera a esperança num eventual governo de transição com Michel Temer.
Com esse PMDB? Com Cunha? Com Renan? Com um Manoel Júnior na Saúde?
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