Jornalista Andrade Junior

terça-feira, 29 de setembro de 2015

"O estrago está alto demais",

por Pedro Luiz Passos Folha de São Paulo

A persistência do ambiente de indefinição política, somada à crise econômica cada vez mais profunda, tem provocado uma destruição em massa do valor dos ativos brasileiros. Segundo a consultoria Economática, as companhias listadas na BM&FBovespa perderam US$ 1 trilhão em valor de mercado entre abril de 2011 e setembro de 2015.
Não se trata de simples variação contábil ou de perdas que afetam apenas o mundo corporativo, o que já seria motivo para preocupação, sendo as empresas as principais responsáveis pela arrecadação tributária, pelos empregos e pelos investimentos. Esses números apontam que parte relevante da riqueza nacional se evaporou nos últimos anos e, com ela, a confiança dos brasileiros.
O derretimento dos ativos coloca em ação uma engrenagem perversa, que, nos movimentos subsequentes, acentuará o desemprego e a retração do já frágil fluxo de investimentos. Ou seja, a conta está alta e, se nada for feito, pode ficar maior.
Os efeitos já se manifestam com vigor, mas sem a dimensão que tende a ganhar corpo em 2016. A taxa de desemprego foi a 8,3% no segundo trimestre, ante 6,8% no mesmo período de 2014, e tem viés ascendente. Como em outros períodos de recessão, o esgarçamento do emprego atingirá, na próxima etapa, a renda, que vinha sendo preservada pelos ganhos reais dos acordos salariais e pela pujança no mercado de trabalho. Isso deixou de existir.
Diante de tal cenário, não há o que esperar. Com a retração econômica e o imbróglio político se alimentando mutuamente, já passa da hora de se adotar o único caminho exequível para enfrentar a crise: a abertura de um diálogo franco e transparente entre as principais lideranças do país para buscar consensos mínimos capazes de romper os impasses que paralisam as decisões e angustiam a sociedade.
Não será, porém, o velho e desgastado método de buscar acordos ou trocas com representações políticas de baixa estatura que trará a legitimidade necessária para alcançar a aprovação da sociedade a essa nova agenda.
Sem esse nível de entendimento, qualquer esforço no campo econômico estará condenado ao fracasso, aprofundando o caos ora instalado no país. Isso envolve Congresso, Executivo e todos os líderes genuinamente preocupados com o futuro turvado por uma crise que nem sequer deveria existir.
É momento de revisar, antes de criar impostos e elevar alíquotas, a parafernália de subsídios e desonerações, assim como passar a estrutura do Estado por um pente-fino, em que o objetivo não seja apenas a redução de custos, mas o aumento de eficiência e produtividade.
A agenda mínima deve contemplar medidas que ofereçam perspectivas para estabilizar as contas públicas, ao mesmo tempo em que preservem a rede de proteção social contra os efeitos deletérios da recessão.
Tal sinalização torna possível restaurar a confiança e, por tabela, o crescimento da economia. O horizonte empresarial desanuviado e a política apaziguada são condições para se desobstruir entraves estruturais, como o deficit da Previdência, que carece de regras atualizadas à realidade demográfica, a reforma tributária e a revisão da legislação trabalhista, além de maior aproximação com a economia internacional.
Ainda que antiga, essa agenda continua na ordem do dia. Ela não avançará sem que o cenário de curto prazo se altere profundamente. Gestos claros para essa construção é obrigação que os governantes não podem mais adiar, mostrando-se à altura da gravidade da crise e capazes de resolver a confusão criada por eles mesmos. 






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