por Luli Radfahrer Folha de São Paulo
Podem berrar, espernear, choramingar, esbravejar ou se lamentar. Podem
protestar nas ruas, assembleias, Facebook ou WhatsApp. Podem barrar a
iniciativa no Congresso, no Senado, no Judiciário e nas reuniões de
Centros Acadêmicos. Pouco importa o resultado, ele terá sido meramente
burocrático. Da mesma forma que um dia se foram as presidências de João
Figueiredo, José Sarney, Itamar Franco e George W. Bush, resta pouco
deste mandato presidencial que mal começou.
A decisão não pertence mais à ocupante do cargo ou às forças políticas
que desejam a sua saída. Basta uma pequena análise da estrutura de redes
para se constatar que o poder Executivo, de tão acuado, se tornou
transparente.
Desde Charles Darwin que se sabe que o mais adaptado - não o mais forte -
é aquele que tem a maior probabilidade de sobrevivência. Mas isso não
parece passar pela cabeça do governo que, no melhor estilo Maria
Antonieta a propor brioches, fala na CPMF como se fosse transitória ou
capaz de resolver alguma coisa. Em seu mundo de fantasia parecem não
perceber que a paciência se foi.
Não há como pedir para uma população que paga mais de 35% de seu salário
que ajude um governo perdulário e caótico, que nunca deu praticamente
nada em troca.
Investigada pelo Supremo, barrada no Congresso, relutante a tributar os
ricos, desprovida do apoio dos trabalhadores, empresários, funcionários
públicos e movimentos sociais para qualquer novo pacote, a presidência
ainda precisa dar ouvidos para seu ex-padrinho, que não tem cargo ou
importância outra além de ter criado boa parte do problema. O resultado é
uma enorme desorientação, que confunde aliados, irrita bases,
enlouquece o setor produtivo e abre rombos ainda maiores no orçamento.
No mundo da tecnologia, decisões assim são constantes. Kodak, Nokia e
Blackberry são exemplos de empresas cuja prepotência ignorou a demanda
por mudança. Como elas, a presidência foi julgada, condenada e executada
antes mesmo de ser processada.
Da mesma forma que um chefe que logo será demitido, um vereador em
debate corporativo, um técnico de futebol que acumula derrotas, um tio
chato em reunião de família ou um marido que está prestes a ser
dispensado, o Poder Executivo dá claros indícios de ter sido contornado.
Ninguém sabe direito o que fazer com ele, até que ponto levá-lo a sério
e por quanto tempo suportá-lo.
Sua irrelevância chegou a tal ponto que pouco importa quem ocupe o
assento. Por mais que os fanáticos de um lado afirmem que o país acabará
na eventualidade de um impeachment, ou que os radicais do outro lado
acreditem que a crise acabaria por mágica com a troca de comando, a
maioria das pessoas com algum bom senso já percebeu que o mais provável é
que nada mude.
O encolhimento da importância do poder executivo não é fato novo, e tem
pouco a ver com a Petrobras. Desde antes das eleições uma disputa de
anões era configurada. Quatro não-candidatos, irrelevantes em discurso e
importância, se engalfinharam nos debates mais monótonos dos últimos
tempos. Ninguém levaria a sério uma candidatura do Aecinho, da Marina ou
da Luciana, se seu concorrente não fosse alguém igualmente apático. A
situação era tão pobre que nem o José Serra, freguês habitual com
vocação para a lanterna, participou. Agora que a situação esquenta e que
a presidente pode perder o cargo que se passa a temer a figura do vice,
que como Itamar, Alckmim e Sarney, nunca teria carisma para um posto
tão importante.
Sua irrelevância não termina com a figura manufaturada de uma presidente
tão merecedora de seu cargo quanto Celso Pitta o foi da prefeitura de
São Paulo. Da mesma forma que ela, seus ministérios raramente são
lembrados. Fala-se em reforma ministerial como se boa parte de seus
ocupantes, tipo um tal de Mercadante, ainda estivesse em exercício. Em
teoria, ele está. Na prática, discute-se a sua saída como se ele não
estivesse presente. Quando se fala em ministros, a propósito, a primeira
imagem que surge é a dos principais ocupantes do Poder Judiciário, mais
impulsivos e grandiloquentes do que aconselharia o decoro do cargo.
As redes, digitais ou não, mostram que há espaço para todo tipo de
política, com exceção da inexistência. Pior do que uma instituição
detestada é uma instituição ignorada. Como acontece frequentemente com a
lei ou com figuras de autoridade, nem sempre é possível ser popular.
Leis odiadas podem ser contestadas ou, com o tempo, incorporadas à
dinâmica social. Leis ignoradas não passam de papéis fictícios.
Nessas condições, pouco importa quem vença. Todos perdem.
EXTRAÍDADEROTA2014BLOGSPOT
0 comments:
Postar um comentário