por José Nêumane O Estado de São Paulo
Que WikiLeaks, que Swissleaks, que cartéis mexicano e colombiano de
drogas, que Fifagate, que nada! O escândalo top do mundo hoje é outro.
Nada se lhe compara em grandeza aritmética, ousadia delituosa ou
desrespeito a valores éticos. E é coisa nossa! Embora nada tenhamos a
nos orgulhar de que o seja. Ao contrário!
Após se ter oposto ferozmente à escolha de Tancredo Neves pelo Colégio
Eleitoral para dar início à Nova República; à posse e ao governo de José
Sarney, a Fernando Collor, que ajudou a derrubar; ao sucessor
constitucional deste, Itamar Franco, de cuja ascensão participou; e a
Fernando Henrique Cardoso, o Partido dos Trabalhadores (PT) chegou ao
governo federal com seu maior líder, Luiz Inácio Lula da Silva, e se
lambuzou no pote de mel do poder sem medo de ser feliz.
O primeiro objetivo caiu-lhe no colo como a maçã desabou sobre a cabeça
de Newton. Era de uma obviedade acaciana. Sob crítica feroz da oposição,
que o PT comandava, os tucanos privatizaram a Telebrás e, devidamente
desossado, o filé apetitoso das operadoras de telefones foi devorado na
nova administração. Sob as bênçãos e os olhos cúpidos do padim Lula, a
telefonia digital foi entregue a consórcios nos quais se associaram
algumas operadoras internacionais, com a experiência exigida no ramo,
burgueses amigos e fundos de pensão, cujos cofres já vinham sendo
arrombados pelos mandachuvas das centrais sindicais. Nunca antes na
história deste país houve chance tão boa para mergulhar na banheira de
moedas do Tio Patinhas.
Só que o negócio era bom demais para ser administrado em paz. Logo os
concessionários se engalfinharam em disputas acionárias, que mobilizaram
a Polícia Federal (PF), a Justiça nacional, os órgãos de garantia de
combate a monopólios e até instrumentos de arbitragem internacional. No
fragor da guerra das teles, os primeiros sinais de maracutaia dividiram
as grandes rotas com os aviões de carreira. Sabia-se que naquele pirão
tinha caroço. Mas quem ficou com a parte do leão?
Impossível saber, pois este contencioso está enterrado sob sete palmos
de terra. Desde o Estado Novo, os sindicatos operários ou patronais
administram sem controle externo caixas que têm engordado ao longo do
tempo com a cobrança da Contribuição Sindical, que arrecada um dia de
trabalho de todo trabalhador formal no Brasil, seja ou não
sindicalizado. Sob a égide de Lula, as centrais sindicais foram
incluídas na divisão desse bolo gordo e açucarado. E o sistema
financeiro, acusado de ser a sanguessuga do suor do trabalhador,
incorporou a esse cabedal os fundos de pensão. Sob controle de
dirigentes sindicais, estes ocultam uma caixa-preta que ninguém tem
poder nem coragem para abrir.
Só que o noticiário sobre tais episódios foi soterrado pela avalanche de
denúncias provocada pelas revelações da Ação Penal (AP) 470, já julgada
pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e conhecida popularmente pela
denominação que lhe foi dada pelo delator, Roberto Jefferson – o
mensalão. Agora, após seu julgamento ter sido concluído e com os réus
condenados, este é visto quase como lana-caprina desde a eclosão de
outro mais espetacular: a roubalheira do propinoduto da Petrobrás
devassada pela Operação Lava Jato. Mas a cada dia fica mais claro que os
dois casos se conectam e se explicam.
A importância de elucidar um crime ao investigar outro foi comprovada
quando, na Operação Lava Jato, a PF encontrou nos papéis de Meire Poza,
contadora do delator premiado Alberto Youssef, a prova de que o operador
do mensalão, Marcos Valério, deu R$ 6 milhões ao empresário Ronan Maria
Pinto, como tinha contado em depoimento referente à AP 470. Segundo
Valério, essa quantia evitaria chantagem de Ronan, que ameaçava contar o
que Lula e José Dirceu tinham que ver com o sequestro e a morte de
Celso Daniel, que era responsável pelo programa de governo na campanha
de 2002.
Mas nem essa evidência da conexão Santo André-mensalão-petrolão convence
o PSDB a dobrar a oposição do relator da CPI da Petrobrás, Luiz Sérgio
(PT-RJ), e levar Ronan a depor, como tem insistido a deputada Mara
Gabrilli (PSDB-SP). É que os tucanos articulam uma aliança com o atual
dono do Diário do Grande ABC para enfrentar o petista Carlos Alberto
Grana na eleição municipal de Santo André. E este corpo mole pode
dificultar o esclarecimento da verdade toda.
A Lava Jato já produziu fatos antes inimagináveis, como acusações contra
os maiores empreiteiros do País e até a prisão de vários deles. É o
caso de Otávio Azevedo, presidente da Andrade Gutierrez, que presidia o
Conselho de Administração da Oi na guerra das teles. Isso revela mais um
investigado em mais de um escândalo. Como Pedro Corrêa e José Dirceu,
acusados de receber propina da Petrobrás quando cumpriam pena pelo
mensalão.
A Consuelo Dieguez, em reportagem da revista Piauí, publicada em
setembro de 2012, Haroldo Lima, que tinha sido demitido por Dilma da
presidência da Agência Nacional de Petróleo, disse que, no Conselho de
Administração da Petrobrás, ele, a presidente e o ex-presidente da
estatal José Sérgio Gabrielli só votavam como o chefe mandava. E agora
Lula é investigado por eventual lobby para a Odebrecht no exterior em
obras financiadas pelo BNDES, a ser devassado em breve numa CPI na
Câmara.
E a Lava Jato chegou à eletricidade. Walter Cardeal, diretor da
Eletrobrás que acompanha Dilma desde o Rio Grande do Sul, foi citado na
delação de Ricardo Pessoa, tido como chefe do cartel do petrolão,
acusado de ter negociado doação de R$ 6,5 milhões à campanha da
reeleição dela. Othon Silva, presidente licenciado da Eletronuclear, foi
preso ontem, sob suspeita de ter recebido propina.
Teles, fundos de pensão, Santo André, mensalão, BNDES, eletrolão e
petrolão não são casos isolados. Eles compõem um escândalo só,
investigado em Portugal, Suíça e EUA: é este Brasil de Lula e Dilma.
extraídaderota2014blogspot
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