Pedro do Coutto
Foi, sem sombra de dúvida, importante, sobretudo pelo caráter singular, a entrevista da presidente Dilma Rousseff, publicada nas edições de terça-feira dos três maiores jornais do país: O Globo, Folha de São Paulo e O Estado de São Paulo. No Globo transformou-se numa excelente reportagem de Ilmar Franco, na Folha de São Paulo em matéria de Natuza Nery. Falei em caráter singular da iniciativa de Dilma Rousseff. De fato. Não me lembro, ao longo de praticamente 60 anos de jornalismo, ter lido uma confissão de culpa, por falta de percepção da realidade, de qualquer presidente da República.
Autocrítica autêntica, marcante, porém incompleta. Faltou Dilma Rousseff dirigir-se mais concreta e diretamente aos eleitores doo país para lhes explicar quais os motivos a levaram a assumir compromissos ao longo da campanha eleitoral e agir de forma contrária uma vez vitoriosa nas urnas. Este sentimento, agravado pela corrução na Petrobrás, conduziu à impopularidade que a atinge.
Afirmou ela que o escândalo da Petrobrás é um fato em que ninguém pode interromper o processo em curso no Judiciário, no Ministério Público, na Polícia Federal. Deve ser mantido, assegurou, mesmo que as investigações afetem a cadeia da produção de óleo e gás, e a construção civil. Neste ponto a mensagem, em destino absolutamente claro. O governo não poderá interferir de forma alguma no curso da revelação e punição dos autores do gigantesco assalto. A mensagem, naturalmente, encontrou seu endereço certo. Aliás não um, mas vários endereços, entre os quais aqueles que levam às residências dos integrantes do PT envolvidos até o pescoço na trama. Submersão e condenação irreversíveis.
RETOMADA ANTES DAS ELEIÇÕES?
Após reconhecer não ter percebido a gravidade da crise, ressaltou um aviso à população: a retomada do desenvolvimento econômico só ocorrerá dentro de dois a três anos. Antes, portanto, das eleições de 2018.
Adotou, como costumam fazer os especialistas em matéria econômica, o caminho do futuro, para não ser cobrada no presente. Não adianta. A sequência da retração alcança em cheio o mercado de trabalho e, por consequência , as receitas públicas e o mercado de consumo. Menor o emprego, claro, menor será o consumo. De outro lado, anunciou por fim a redução do número de ministérios, o que já devia ter feito há muito tempo, até porque 39 pastas tornam impraticável o exercício de governar. Não dá tempo para que a presidente da República possa dialogar com todos os seus titulares.
Mas a redução, disse ela, depende de consultas à sociedade. Impossível.
Como a sociedade poderá decidir? O governo – disse Dilma – pretende ouvir os segmentos empresariais afetados. Outra sombra no discurso. Os setores empresariais podem representar a si próprios, o que é legítimo. Mas não podem representar todas as classes sociais em que se divide a população brasileira.
NÃO PRECISA OUVIR NINGUÉM
Falando mais claro, para extinguir ministérios, ela não precisa ouvir ninguém, fora de sua equipe de confiança direta. Sobretudo porque não buscou a opinião de pessoa alguma para implantar 36 ou 39 pastas na esplanada dos ministérios, em Brasília. Como, então, ouvir agora para agir em sentido contrário? Não faz sentido. Conduz agora a que se possa pensar que procure ganhar tempo para diminuir o exagero.
A redução depende de lei e, portanto, de um projeto a ser enviado pelo Executivo ao Congresso. Caso contrário, estaria aberto um precedente para que a população tivesse de opinar sobre as medidas de governo. E opinaria de que forma? Através de um plebiscito analisando as várias opções a seu dispor? Não é possível. Dilma Rousseff tem que assumir a iniciativa concretamente e remeter ao Legislativo suas próprias opções para que, enfim, deputados e senadores, escolham as alternativas. Apenas isso.
extraídadatribunadainternet
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