por Alexandre Schwartsman Folha de São Paulo
Ainda em minha encarnação corporativa tive de entrevistar vários
candidatos a uma posição nas diversas instituições em que trabalhei. Uma
pergunta se mostrou particularmente reveladora: qual o seu maior
defeito? Não era incomum que o entrevistado respondesse
"perfeccionismo", senha para que fosse, claro, rejeitado: ou não fazia a
menor ideia de seus verdadeiros defeitos ou estava simplesmente
tentando enrolar o entrevistador.
Tive a mesma sensação ao ler trechos da entrevista da presidente em que,
instada a reconhecer seus erros, respondeu ter sido a "demora em
perceber que a situação era mais grave do que imaginávamos".
E segue: "Ninguém imaginaria que o preço do petróleo cairia de US$ 105
(...) para US$ 43". Sobre o aumento do gasto público, argumenta que só
no fim do ano passado é que teria percebido que a arrecadação caiu. Ou a
presidente não faz a menor ideia dos (muitos) erros que cometeu ou está
tentando nos enrolar. Talvez ambas as alternativas.
Ela insiste na fantasia da origem internacional da crise que vivemos,
capturada na semana passada pelas notícias de uma possível queda de 2%
do PIB no segundo trimestre, do desemprego a 7,5%, o mais alto
registrado em julho desde 2009, e pela destruição de quase 900 mil
empregos formais nos últimos 12 meses.
Parece se esquecer do que ocorreu no seu primeiro mandato, mas nada
custa refrescar sua memória: o PIB cresceu ao estonteante ritmo de 2% ao
ano, levando à alucinante expansão de 1% anual da renda per capita; a
inflação, mesmo com controles de preços, superou 6% ao ano; a dívida
pública aumentou de 51% para 59% do PIB; por fim, o deficit externo
alcançou mais de US$ 100 bilhões (4,5% do PIB) no ano passado. Não há
dúvida de que se trata de desempenho medíocre; em compensação, foi
acompanhado de desequilíbrios macroeconômicos severos...
Não se ponha a culpa no resto do mundo. Entre 2011 e 2014, o PIB mundial
cresceu 3,6% anuais, marginalmente mais que os 3,5% ao ano registrados
nos quatro anos anteriores. No mesmo período os termos de troca, a
relação entre os preços das coisas que o Brasil exporta e as que
importa, foram 12% melhores do que o observado no segundo mandato do
presidente Lula, quando o país cresceu a 4,5% ao ano.
As causas foram domésticas. O erro da presidente não foi a demora em
perceber que a situação internacional mudou, mas sim ter sido incapaz de
entender que a desaceleração da economia brasileira depois de 2010 se
deveu a restrições do lado da capacidade de produção, da falta de mão de
obra às carências de infraestrutura.
Por causa disso tomou medidas para estimular a demanda, que não apenas
falharam em acelerar o crescimento como levaram aos desequilíbrios
macroeconômicos acima listados.
É por esse motivo, não pela pressão de "ideólogos de inspiração
neoliberal, com forte apoio no empresariado", que foi forçada a adotar a
atual política econômica. A verdade é que não restou opção ao governo
que não fosse abjurar das práticas do período 2011-2014 e correr para
evitar o ainda pior.
Não é por outra razão que a presidente, outrora orgulhosa condutora da
política econômica heterodoxa, é hoje forçada a se contentar com o papel
de rainha da Inglaterra, tutelada em seu labirinto, contando os dias
para se livrar do fardo que a persegue.
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