editorial da Folha de São Paulo
Ainda que expressivo em termos numéricos (37 mil participantes em São
Paulo, de acordo com o Datafolha), o dia de mobilizações contra o
impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT) não resiste à comparação
com as manifestações de domingo (16), quando, segundo o instituto, 135
mil foram à av. Paulista protestar contra o governo.
Num pleno dia útil –o que já contrasta, negativamente, com a civilidade
do final de semana–, os atos em favor de Dilma contaram com a conhecida
máquina de entidades atreladas ao sistema petista, como a CUT e a UNE, a
que se somaram outras agremiações, como o PSOL e o Movimento dos
Trabalhadores Sem-Teto.
Esta última circunstância contribui para que, na análise de quinta-feira
(20), a qualidade das manifestações, mais que sua dimensão numérica,
seja posta em destaque.
Nada poderia revelar mais o isolamento da presidente do que o fato de se
registrar, no ato que lhe era favorável, grande quantidade de críticas
aos rumos adotados neste quarto mandato petista.
Ao lado do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ),
foi alvo de ataques o atual ministro da Fazenda, Joaquim Levy. Ou seja,
uma manifestação pró-governo tratou de condenar o pouco de governo que
ainda resta no Planalto.
Os duros ajustes formulados pela equipe econômica correspondem à
inevitável compreensão de uma emergência que, em seu primeiro mandato,
Dilma não só se recusou a encarar como ajudou a produzir.
Seus efeitos, claramente impopulares neste momento, são o tênue e
derradeiro sinal de que alguma estratégia é perseguida por um governo
imerso na desmoralização e no impasse político.
Tanto quanto os escândalos na Petrobras –que pesam decisivamente na
reprovação ao governo verificada nos atos de domingo–, o chamado
"estelionato eleitoral" cobra agora seu preço junto aos setores
identificados com o campo petista e seus confins à esquerda.
O paradoxo de quinta-feira surge, portanto, à luz do dia. O governo se isola dos dois lados.
Tendo prometido a continuidade de uma política econômica que, no fundo,
não passava de irresponsável descuido com a inflação e desastrado
exercício de manipulação das contas públicas, a campanha eleitoral de
Dilma Rousseff não tinha como não se desmoralizar do ponto de vista
ideológico –do ponto de vista político e ético, tudo já entrava em
derrocada.
Juntaram-se, num dia que era de trabalho para a maioria da população, os
últimos adeptos de um sistema no qual, provavelmente, nem sequer
acreditam de fato. Rejeitaram, com razão, saídas antidemocráticas para a
crise; não deixaram, todavia, de expressá-la também.
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