editorial do Estadão
O governo é novo, seus 39 ministros estão em seus postos e a pauta
política nos círculos oficiais em Brasília está dominada pela discussão
dos projetos do segundo mandato de Dilma Rousseff. Certo? Errado! O que
mais se ouve na capital federal são as queixas estridentes de
correligionários e "aliados" da presidente da República. Ninguém parece
satisfeito com a parte do Ministério que lhe coube. E a chiadeira só faz
aumentar porque agora falta distribuir - este é o termo adequado - os
cargos dos escalões inferiores da administração direta e o comando das
estatais. Como é óbvio que é impossível deixar todo mundo satisfeito, a
pergunta que se segue também é evidente: até que ponto a predominância
de um fisiologismo cada vez mais escancarado pode conviver com a
obrigação do governo - qualquer governo - de promover o bem comum? Ou
seja, de administrar a coisa pública com eficiência e honestidade.
O quadro brasiliense é lamentável e preocupante, mas nada surpreendente.
Reflete o esgotamento do chamado "presidencialismo de coalizão" que
Lula, com sua grande vocação e habilidade para o varejo da política,
levou a extremos em nome da "governabilidade", como se essa só fosse
possível de braços dados com a escumalha da política que o PT passara a
vida inteira - até chegar ao poder, bem entendido - malhando sem dó nem
piedade. Esse jeito de governar funcionou aos trancos e barrancos
enquanto contou com o carisma e a liderança de Lula presidente.
Com Dilma no poder, dois fatores em particular agravaram o processo de
deterioração do quadro político-partidário. Primeiro, o fato de que
Dilma não é Lula e, mais para autoritária do que conciliadora, nunca
teve aptidão nem paciência para fazer concessões a "aliados". Depois, o
quadro partidário não para de inchar. Hoje já são 32 as legendas que
mamam no generoso úbere da viúva, 28 delas com representação no
Parlamento. Haja cargo de primeiro, segundo e terceiro escalões para
abrigar a gulosa "base aliada".
O resultado é que nem mesmo dentro de seu PT, se é que se pode dizer
assim, Dilma tem sossego. Conseguiu reunir em torno de si, na intimidade
do Palácio do Planalto, um time de petistas que considera de confiança,
livrando-se, por exemplo, do notório Gilberto Carvalho - aquele que,
sempre que pode, afirma que não é ladrão. Para tanto, afastou-se da
corrente majoritária do PT, lulista. E o partido governista acabou
perdendo quatro Ministérios. Aflito, o presidente da legenda, Rui
Falcão, dedica-se a uma intensa romaria a gabinetes ministeriais na
tentativa de garantir, nem que seja nas representações nos Estados, uma
boquinha para a companheirada ameaçada de ficar ao relento.
Mas nem mesmo partidos "aliados" com o comando de pastas importantes
estão satisfeitos. Dilma nomeou para a Educação - uma pasta de
importância vital que qualquer governo mais sério deixaria fora da
aviltante partilha - Cid Gomes, um prêmio para sua fidelidade à
presidente. Mas o PROS, partido de Gomes, já anunciou que não teve nada a
ver com a nomeação. Quer mais.
O PMDB, apesar de ter ficado com uma pasta a mais do que no primeiro
governo Dilma, está descontente porque, se ganhou em quantidade, perdeu
no poder político representado pelo montante das verbas que passará a
administrar. Como protesto, os peemedebistas boicotaram a posse da
senadora Katia Abreu no Ministério da Agricultura - uma escolha de Dilma
e não uma indicação do partido.
Está claro que, na composição do novo gabinete, Dilma procurou também
reduzir o poder de seu principal aliado no governo. Mas não deixa de ser
sintomático o fato de o PMDB ter-se incomodado exatamente com a
nomeação de uma correligionária que é inquestionavelmente do ramo,
enquanto, no geral, o nível desse ministério é considerado medíocre, ou
pior que isso.
É que nenhum dos atores dessa ópera que se apresenta em Brasília tem
espírito público ou está interessado em promover o bem comum,
administrando com zelo e eficiência a parcela da administração pública
que lhe cabe. Estão todos exclusivamente comprometidos com seus projetos
pessoais ou de grupo. Pobre Brasil.
fonte rota2014
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