Alessandra Duarte - O Globo
Entre 2003 e 2013, mais 144 mil servidores federais; para economistas, porém, cortar ministério terá pouco impacto
Entre 2003 e 2013, o número de servidores públicos no governo federal
subiu 28%, de 456 mil servidores para quase 600 mil. A quantidade de
cadeiras de ministros também aumentou — e hoje é recorde, fazendo do
Brasil o país com mais pastas num ranking das 50 nações com as maiores
economias. Mas cortar ministérios não vai fazer milagre:
estudos e análises de economistas sobre a situação da máquina pública
federal mostram que o governo Dilma Rousseff vai precisar de uma reforma
administrativa que signifique mais do que mudança de status de
ministério e incorporação de órgãos, se quiser fazer as contas públicas
respirarem.
A comparação da administração federal entre 2003 e 2013 é parte de
levantamento realizado pelo economista e pesquisador do Instituto de
Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) José Celso Cardoso, que em 2011
coordenou estudo sobre o perfil da ocupação no setor público. Quando é
vista a variação em cada órgão, um dos maiores aumentos foi na
Presidência da República (143%, de 3,7 mil para 9,1 mil), incluindo a
Vice-Presidência e órgãos como a Anac, a Abin e as secretarias ligadas à
Presidência, como Portos, Assuntos Estratégicos e Aviação Civil. Minas e
Energia teve aumento de 69% (de 2 mil para 3,4 mil);
Transportes, de 62% (de 3,8 mil para 6,2 mil); e a Educação, alvo do
lema “Pátria Educadora” do segundo governo Dilma, de 50% (de 164 mil
para 247 mil). A conta não inclui as estatais.
— Apesar desse aumento de 28%, o ritmo de crescimento do emprego público
diminuiu no 1º governo Dilma em relação aos governos Lula, por causa de
fatores como a crise internacional e a queda do próprio crescimento
econômico brasileiro — diz Cardoso, afirmando também que parte desse
aumento vem de concursos feitos antes do primeiro governo Dilma, mas que
tiveram nomeação e posse dos novos servidores a partir de 2011.
Cardoso também explica que, ao se examinar período maior — de 92 até o
governo Dilma —, o número atual de servidores federais é menor do que o
que havia na 1ª metade dos anos 90. Além disso, diz ele, o perfil do
servidor federal também mudou, pois “aumentou mais a contratação de
servidores para atividades-fim, como médicos, do que para
atividades-meio, como motoristas”.
— Há uma medida que poderia ser adotada nessa reforma, mas que está
sendo deixada de fora dessa discussão: a queda nos juros da dívida
pública, que faria com que o governo passasse a pagar menos a quem tem
títulos da dívida pública. O governo economizaria muito mais com isso do
que incorporando ministérios ou mudando status de pastas — sublinha
Cardoso. — Um argumento para esses juros altos é que isso ajudaria a
combater a inflação; mas a inflação que estamos tendo é inflação dos
preços administrados pelo próprio governo, não é inflação causada por
alto consumo. Além de economizar por passar a pagar menos juros a quem
tem título da dívida pública, o governo veria a arrecadação subir se
diminuísse esses juros, porque juros baixos atraem investimento
produtivo.
Em outro estudo, do ex-diretor da Firjan e hoje consultor Augusto
Franco, o Brasil aparece como o país com maior número de ministérios num
ranking com as 50 maiores economias do mundo. Franco diz que a situação
brasileira melhora “muito pouco” com o corte anunciado:
— O país até sai do 1º lugar, mas vai apenas para a 6ª colocação, que passa a dividir com a Nigéria.
Nesse grupo de 50 economias mais importantes, os países têm, em média,
20 ministérios. É o caso, por exemplo, de Japão (20), Reino Unido (22),
Itália (18), México (17), Argentina (17), Chile (21) e França (17).
Entre os Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), a China,
com 21 pastas, e a Rússia, com 25, ficam perto da média, enquanto a
África do Sul tem 35 e a Índia, 27. O recorde brasileiro em número de
ministérios foi publicado no último dia 16 na coluna de Ancelmo Gois.
O 2º governo FH terminou com 24 pastas. O ex-presidente Lula acabou seu
2º mandato com 37 ministérios. Dilma passou a ter 39. Segundo Franco,
apesar de o corte de ministérios anunciado agora pela petista estar no
caminho certo do ponto de vista econômico, do ponto de vista político
ele deveria ser acompanhado de reforma política:
— Foi a pressão dos partidos aliados que fez com que o país chegasse a
ter 39 ministérios. Essa pressão só vai diminuir com reforma política.
Comparar número de ministérios não é, porém, a melhor maneira de avaliar
reformas administrativas, diz José Celso Cardoso, do Ipea:
— Em comparações entre países, importa menos o número de ministérios e
mais o plano estratégico de cada governo. Depende do contexto
socioeconômico e do plano de cada governo, se é viabilizar exportação,
se é atender população pobre... Depende de quais necessidades cada país
tem e de quais ele quer atender.
Para Cardoso, a eficácia e a efetividade dos programas estratégicos do
governo federal aumentariam se o Planejamento fosse desmembrado:
— Hoje, esse ministério atua em duas dimensões: uma é o acompanhamento
do Orçamento; a outra, a formulação estratégica dos programas, que o
ministério não consegue fazer justamente porque é consumido pela outra
dimensão. Essa parte estratégica poderia ser fortalecida se saísse do
ministério e fosse para a estrutura da própria Presidência.
AUMENTO DE CARGOS COMISSIONADOS
Além de aumento do total de servidores federais, ao longo dos anos 2000 e
até o fim do 1º governo Dilma também houve aumento no número de cargos
comissionados, aponta levantamento de Felix Garcia Lopez, também
pesquisador do Ipea. Lopez mostra que, de 1999 a 2013, o número de
comissionados foi de 16,6 mil para cerca de 23 mil, um aumento de 38%.
O que mais cresceu foram as faixas superiores dos cargos DAS (Direção e
Assessoramento Superiores, conhecidos como comissionados ou de
confiança): nos DAS 4 a 6, a ampliação foi de 85%, enquanto nos 1 a 3,
de 29%. O crescimento maior ao longo de todas as faixas foi, porém, dos
cargos comissionados ocupados por servidores.
Outro ponto visto pelo estudo é que a rotatividade dos cargos
comissionados é menor nas áreas econômicas, e maior nas áreas sociais.
— A rotatividade tem momentos de pico, que são os primeiros anos de
governo dos presidentes. A média de rotatividade dos DAS é 30%: ou seja,
a cada ano, 3 de cada 10 nomeados (para cargos comissionados) são
substituídos — diz Lopez, destacando o peso dos cargos de confiança
regionais. — Cargos regionais são muito disputados e cruciais para
entender o apoio parlamentar ao presidente da República. É um erro
falarmos que o presidente tem 23 mil cargos. Não tem. Pode ter alguma
interferência nos cargos 5 e 6, que são 5%, ou 1.300 cargos.
Para Lopez, corte de ministérios e cargos “muda pouco em termos de racionalidade do gasto”:
— A maior parte dos órgãos executa políticas, e quase todas são relevantes.
Provavelmente, o que haverá são cargos DAS redistribuídos ou DAS menores
fundidos em DAS maiores. O problema não é o cargo, mas termos, por
exemplo, falta de critérios para aferir desempenho dos servidores. Se
houvesse critérios claros nisso, o fato de ser servidor ou não (a ocupar
o cargo de confiança) seria pouco relevante. Só é relevante agora
porque é um remendo em que se busca ter maior segurança de que a pessoa
domina a função que deve desempenhar.
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