por Guilherme Fiuza O Globo
Os companheiros agradecem as boas maneiras, e partem desinibidos para novos saques
Dilma foi barrada no Palácio. A presidente vinha andando pelos salões da
sede do governo federal quando um funcionário abriu os braços e impediu
a passagem dela. O episódio se deu no momento em que vazava o plano do
governo petista de recriar a CPMF. Foi como se o funcionário do Palácio
tomasse a frente de um país abobado, prestes a levar calado mais uma
facada dos companheiros, e dissesse a Dilma: “Não, minha senhora. CPMF é
demais. Daqui a senhora não vai passar”.
A expressão ultrajada da presidente foi captada pelo fotógrafo Orlando
Brito — no momento em que o chefe interino do Cerimonial do Planalto,
Fernando Igreja, se punha no caminho dela, deixando passar apenas os
atletas dos Jogos Parapan-Americanos que visitavam o Planalto. Nenhuma
explicação factual para o acontecimento patético será tão precisa quanto
o grito simbólico da cena: Dilma foi barrada no Palácio porque não
devia mais estar lá.
A representante legal do maior projeto de pilhagem da História do país
ainda respira por aparelhos porque, no quesito aparelhagem, seu partido é
bom. Não é para qualquer um ter advogados de estimação na Corte
Suprema, nem um procurador-geral da República para chamar de seu. Nas
listas de Janot, o petrolão parece um desastre natural, uma nevasca de
propinas que se abateu sobre os políticos brasileiros. Olhando, ninguém
diz que é um esquema montado pelo estado-maior petista para roubar a
Petrobras em favor do partido governante. Sabatinado no Senado, Rodrigo
Janot disse que pau que bate em Chico, bate em Francisco. Só não bate em
Dilma — porque em mulher sapiens não se bate nem com uma franja.
A presidente já foi citada mais de uma dezena de vezes na Lava-Jato, que
produziu uma nevasca de evidências do financiamento eleitoral dela com
dinheiro sujo de petróleo. Os tesoureiros petistas, entre delatados,
denunciados, condenados e presos, já entraram para o anedotário como a
profissão mais perigosa do mundo — anedota que só tem graça para os
milionários com estrelinha na lapela. Enquanto o crime de
responsabilidade dormita no TCU, com a tropa do cheque pedalando as
pedaladas fiscais, o bom entendedor, e também o nem tão bom, já viu que o
governo do PT montou um sistema de assalto ao dinheiro do povo — o que
talvez explique o seu título de governo popular. E o impeachment,
misteriosamente, continua sendo pronunciado como palavrão em convento.
Os companheiros agradecem as boas maneiras, e partem desinibidos para
novos saques. E bota desinibição nisso: no momento em que o país entra
oficialmente em recessão, com um rombo recorde de R$ 10 bilhões nas
contas públicas em julho — joias de uma década de pilhagem —, os
oprimidos profissionais tiram da cartola a ressurreição da CPMF. Já que
você não quer falar em impeachment, querido contribuinte, vai passar a
pagar pixuleco também. Mas não se preocupe: é pixuleco oficial,
contabilizado, tudo certinho. Você nem vai precisar apertar a mão do
companheiro Vaccari.
Para um governo tão preocupado com o povo, que chega a destruir o setor
elétrico para fingir que a conta de luz é barata, recriar a famigerada
CPMF é o sinal definitivo do desespero. Estão raspando o tacho. Até
Delfim Netto, o oráculo do Lula, resolveu fazer o boletim de ocorrência
do desastre financeiro. E note-se que Delfim foi aquele amigo das horas
difíceis, sempre com um malabarismo teórico na ponta da língua para
dizer que a administração petista ia muito bem, obrigado. Para Delfim
Netto, desembarcar do seu doce teatro progressista, o brejo realmente
deve ter alcançado a vaca.
Mas, para um povo cordial e pacato, até o brejo é relativo. Daqui a
pouco aparece um intelectual antenado para dizer que, se é para tombar
no chão, melhor afundar... Ou então que o brejo já vinha se chegando há
muito tempo, e a vaca só estava no lugar errado, na hora errada. Os
respeitáveis economistas Mansueto Almeida, Marcos Lisboa e Samuel
Pessoa, por exemplo — que não são malabaristas — escreveram que o tombo
fiscal brasileiro tem pouco a ver com a era petista. Sugeriram inclusive
que este signatário é maniqueísta e só pensa no PT. Seja como for, após
12 anos de déficits escondidos com maquiagem contábil, reaquecimento da
inflação, derrubada dos investimentos graças ao sequestro do Estado
pelo partido e, finalmente, uma recessão genuinamente petista, as
ponderações do trio de notáveis são pura poesia para João Santana.
Melhor mesmo parar de pensar no PT. Vamos concentrar só no brejo. Mas se
você acha, ainda assim, que pagar CPMF para financiar pixuleco é um
pouco demais, faça como o chefe do cerimonial do Palácio: tome posição e
diga àquela senhora que daqui ela não passa.
extraídaderota2014blogspot
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