FERNANDO GABEIRA O GLOBO
Levei a pergunta para uma dezena de políticos experimentados
Tirei terno e gravata do armário e fui a Brasília. Onde está a saída
para a crise? Levei a pergunta para uma dezena de políticos
experimentados. Nenhum deles apontou a saída imediata. É um cuidado
razoável. O máximo que se consegue é apontar variáveis que possam
definir os rumo da crise. Comportamento do governo, ajuste econômico,
curso da Operação Lava-Jato são as mais citadas.
Asensação predominante é a de que algo vai acontecer, e ninguém sabe
precisamente o que é. A hipótese de um governo sangrando até 2018 é a
mais improvável, embora seja esse o desejo de uma parcela de
observadores, dentro e fora do Congresso. Marchamos para o desconhecido.
É uma fase delicada. Os conservadores tendem a achar que o diabo
desconhecido é sempre pior do que o existente. Querem mudança, mas
dentro de um quadro planejado, com resultados previsíveis. Mas, nesses
casos, sempre existe o argumento de que, muitas vezes, é preciso
caminhar, mesmo sem saber o que nos espera, com uma abertura para a
novidade. Quanto ao ajuste econômico, deve ser objeto de muita
discussão, basicamente sobre quem paga a conta. A tendência é de dias
mais duros, com possibilidade de racionamento de energia. É o que os
técnicos propõem. Não porque faltará energia para o consumo em 2015. Mas
porque é preciso poupar, pois, sem oferta adequada de energia, não
existe retomada em 2016.
De qualquer forma, o ajuste econômico passou a ser de interesse
nacional, não só por causa da realidade interna, mas também da percepção
externa. Graças à expectativa do ajuste, o Brasil não foi rebaixado à
condição de país especulativo, com inevitável fuga do capital. Sou
pessimista quanto aos passos do governo. O documento que vazou da
Secretaria de Comunicação mostra como estão perdidos. Falam de tudo, de
robôs, redes sociais, blogueiros, propaganda, mas não falam da mensagem.
Dilma tem os microfones à disposição. Mas não sabe usá-los. Em alguns
casos é possível aprender. Pessoas tímidas, executivos de grandes
empresas fazem um treinamento, chamado media training. Mas não há treino que possa criar um líder para conduzir o país numa tempestade.
Não há mensagem nem presidente capaz de comunicá-la. O panelaço segue
como a batida da temporada. A saída de Dilma é usar a tática de
guerrilha: falar quando o adversário está desprevenido e recuar quando
ele está atento. A outra variável é a Operação Lava-Jato, outro dado
positivo que teve peso para que o Brasil não fosse rebaixado pelas
agências internacionais. No momento, o foco é o PT.
Os políticos deram azar em ter o juiz Sérgio Moro pela frente.
Especialista em lavagem de dinheiro, sabe que rastrear o curso da grana é
o caminho real nas investigações. Com base na informação dos delatores e
em recibos de empresas, as investigações demonstram o golpe do PT:
transformar propinas em doações legais. Leio que o Planalto quer que o
PT demita o tesoureiro. O PT hesita. É difícil passar a ideia de que foi
tudo culpa de um só homem. É gente muito calejada para fingir que João
Vaccari era uma fada de barba que produzia fortunas apenas com o toque
de sua vara de condão. Isso irá parecer um pouco aquela lenda urbana da
filha de família que trabalha fora e volta sempre com presentes caros
para casa. E aí os parentes descobrem, um dia, que a menina faz
programas.
A variável mais importante é pouco discutida em Brasília. Dois milhões
de pessoas foram às ruas, sem nenhum incidente. A sociedade brasileira
ganhou maturidade nas demonstrações e mantém-se vigilante porque sua
sorte está em jogo. O agravamento da crise, a dureza do ajuste econômico
e a mobilização social podem nos levar a um novo momento. Não ouso
descrevê-lo. Sinto apenas que o dilema brasileiro poderá ser esse:
fazer um omelete sem quebrar os ovos. Essa tarefa que parece impossível
para os estrangeiros não é tão distante assim das soluções históricas no
Brasil. Se os culpados pela corrupção na Petrobras forem punidos e
chegarmos a um consenso mínimo sobre o ajuste econômico, abre-se a
possibilidade de um governo de unidade nacional. O PMDB tem ocupado o
lugar do PT. Mas está encalacrado na Operação Lava-Jato. Teria, em caso
de sobrevida, a possibilidade de um aceno nacional. O PT, que sempre
dividiu o país entre pobres e ricos, brancos e negros, reacionários e
progressistas, não tem chance de tentar esse caminho.
O momento é verde-amarelo. Sem nenhum juízo de valor sobre símbolos
históricos, quem o confundiu com o vermelho cometeu um erro decisivo. O
Estado não é um partido, uma política externa não pode refletir a cabeça
da minoria, os direitos humanos não englobam apenas os escolhidos.
Quando desenharam uma estrela no jardim do Palácio e tiveram que
removê-la, deveriam ter compreendido que é insuportável viver num país
que tem dono, seja ele um partido ou um demagogo.
Não se conhecem os protagonistas do futuro. Mas já se sabe quem será atropelado por ele.
EXTRAÍDADOBLOGROTA2014
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