Jornalista Andrade Junior

terça-feira, 21 de abril de 2015

Luciano Coutinho mentiu no Senado, depois mentiu na Câmara

Carlos Newton


Sem esconder o contentamento, o relator da CPI da Petrobras, deputado Luiz Sérgio (PT-RJ), se apressou em propagar que o depoimento do presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Luciano Coutinho, desmente a delação do ex-gerente de Serviços da estatal, Pedro Barusco, que apontou o banco estatal como principal financiador do projeto da empresa Sete Brasil.
É um jogo de verdades e mentiras, digamos assim. Se não é verdade que o BNDES tenha sido o financiador, também não é verdade que Barusco tenha mentido. O economista Luciano Coutinho, que mentiu perante o Senado na terça-feira, ao dizer que o BNDES é obrigado por lei a manter suas operações, na quinta-feira voltou a falsear a verdade na Câmara, divulgando uma versão distorcida da realidade, pois omitiu o que não lhe interessava e só destacou as informações que poderiam ser usadas a favor do governo, do BNDES e da Petrobras.
Ao depor durante oito horas na CPI da Petrobras, Coutinho se comportou como se fosse advogado da presidente da República e chegou a dizer que, se Dilma soubesse de algum ilícito, teria tomado providências, vejam a que ponto chega a subserviência deste famoso economista.
TRADUÇÃO SIMULTÂNEA
Como já explicamos aqui na Tribuna da Internet, Coutinho é o tipo de depoente que necessita de tradução simultânea, sua linguagem é cifrada, quando revela uma coisa sempre esconde outra.
A Sete Brasil foi criada por determinação do governo Lula, para fornecer sondas à Petrobras. Desde o início, ficou acertado que o principal financiador seria o BNDES, por isso o ex-gerente Barusco não mentiu, pois foi diretor da Sete Brasil de 2011 a 2013. A engenharia financeira foi toda baseada na premissa do apoio do BNDES, porque a nova empresa não tinha como oferecer qualquer tipo de garantia. Seu aval eram apenas os sócios – os fundos de pensão Petros, Previ, Funcef e Valia, além dos bancos Santander, Bradesco e o BTG Pactual (a Sete Brasil tem o BTG Pactual como maior acionista individual, mas os três grandes fundos de pensão estatais (Previ, Petros e Funcef) detêm 37,5%).
O BNDES aprovou o financiamento em julho de 2010, mas a burocracia atrasou a liberação, porque a Sete Brasil só existe no papel e não tem ativos, quem de fato fabrica as sondas de perfurações são estaleiros particulares. Como havia a certeza de que o BNDES financiaria o projeto, era só uma questão de tempo, seis bancos então se prontificaram a conceder empréstimos-ponte para a empresa começar a funcionar – Banco do Brasil, Caixa Econômica, Itaú BBA, Santander, Bradesco e Standard Chartered.
LAVA JATO
Repita-se: Barusco não mentiu. O financiador principal era mesmo o BNDES. O que ninguém esperava é que em 2014 surgisse o escândalo da operação Lava Jato, que obrigou o banco estatal a sustar a liberação dos recursos, mas Coutinho não explicou nada disso.
A consequência foi que, sem receber os recursos do BNDES, a empresa de papel está atrasando o pagamento de fornecedores e a construção das sondas, a cargo de cinco estaleiros. Além disso, vem prorrogando, a um custo mais alto que o spread acertado nos contratos originais, o pagamento dos empréstimos-ponte, que já venceram.
O banco britânico Standard Chartered entrou com pedido de execução de garantias do empréstimo, junto ao Fundo de Garantia para a Construção Naval (FGCN), administrado pela Caixa. A cota do banco britânico é estimada em US$ 150 milhões, um valor bem inferior ao dos outros bancos, pois a dívida total é de espantosos R$ 12,23 bilhões.
MENTIU DUAS VEZES
Esta é a realidade sobre a Sete Brasil, que o economista Luciano Galvão Coutinho, como cidadão e funcionário público regiamente pago, teria obrigação de ter esclarecido no Congresso Nacional, mas não o fez. Mentiu no Senado, na terça-feira, ao dizer que o BNDES é obrigado por lei a manter em segredo suas operações, depois mentiu de novo, na quinta-feira, ao contar à Câmara uma versão distorcida da negociata da Sete Brasil, uma empresa de papel que jamais poderia ter sido criada, pois a Petrobras simplesmente deveria ter encomendado a construção das sondas diretamente aos estaleiros, como sempre fez, aliás.
Luciano Coutinho preferiu atuar como advogado de defesa do governo, da Petrobras e do BNDES. Se fosse jurista, seu destino seria o Supremo, não há dúvida. É uma vocação jurídica realmente extraordinária.



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