editorial do Estadão
Promover uma reforma ministerial menos de três meses depois do início do
mandato equivale a uma confissão de incompetência comprovada pelo
malogro da tarefa política elementar de montar uma equipe de governo.
Esta é provavelmente a razão principal pela qual a presidente Dilma
Rousseff se recusa a admitir que a demissão de Cid Gomes do Ministério
da Educação tenha sido o primeiro passo na promoção, mais do que de uma
reforma ministerial, de um realinhamento político indispensável à
conquista de condições mínimas de governabilidade. Mas o fato é que a
presidente da República, embora não possa ignorar que precisa agir
rápida e eficientemente para se livrar da crise da qual se tornou refém,
parece não ter a menor ideia do caminho a seguir. Está perdida como
cego em tiroteio.
Dilma Rousseff é teimosa, mas é impossível que já não tenha desconfiado
de que cometeu um erro gravíssimo ao imaginar que a reeleição lhe
assegurava força política suficiente para reunir em torno de si, no
círculo mais íntimo da equipe de governo, uma turma selecionada com base
no critério de identificação, mais de que com as suas crenças, com o
seu modo autossuficiente, autoritário e arrogante de fazer política. E
foi assim que, abraçada a Aloizio Mercadante, Miguel Rossetto e Pepe
Vargas, Dilma cometeu a supina imprudência de confrontar o PMDB na
eleição para o comando da Câmara dos Deputados.
A partir desse desastre, a relação de Dilma com o Congresso
deteriorou-se por completo. Imediatamente Lula entrou em cena para
recomendar à sua pupila o óbvio: a substituição do time de trapalhões da
articulação política que a cerca e, num plano mais amplo, a abertura de
espaço no Ministério para a composição com o PMDB.
A essa altura dos acontecimentos Dilma se encontrava, no plano político,
diante do mesmo desafio que já enfrentara no âmbito da gestão
econômico-financeira: fazer concessões. Antes mesmo de tomar posse do
segundo mandato, a presidente já se convencera de que a gravidade da
crise econômica no País impunha a adoção de medidas duras para atacar o
descontrole das contas públicas. E, desmentindo tudo o que afirmara na
campanha eleitoral, escalou uma equipe econômica "neoliberal" para
enfrentar o desafio.
Agora, diante de um enfraquecimento geral do Executivo que ameaça
comprometer seu programa de governo, Dilma encara a necessidade de fazer
concessões também na área política. Mas resiste a estas muito mais do
que resistiu àquelas na área econômica. Talvez pelo fato de a política
ser mais suscetível do que a economia à influência de fluxos biliares.
Também porque, se o temperamento da presidente não ajuda em tempos
normais, que dirá quando ela se sente acuada pelo clamor das ruas e pela
vertiginosa queda de popularidade.
Como também na política a toda ação corresponde uma reação em sentido
contrário, as lideranças políticas com que Dilma contava estão se
dispersando. O próprio PT tem-se comportado, no Congresso e nas ruas,
mais como oposição do que como partido do governo, principalmente quando
se opõe às medidas de ajuste fiscal. O descontentamento - de natureza
variada - já leva alguns petistas ilustres, como os senadores Paulo Paim
e Marta Suplicy, a cogitar deixar o partido. Paim disse que tomará essa
decisão se o governo insistir no que chama de "arrocho" do ajuste
fiscal. Marta decidiu há mais tempo e está a caminho do PSB.
Chama a atenção também o distanciamento progressivo do governo do
vice-presidente da República, Michel Temer, que se cansou de ver-se
marginalizado das decisões políticas mais importantes do Planalto, sendo
também presidente nacional do PMDB, e recentemente tem intensificado
contato com líderes da oposição, como os tucanos Fernando Henrique
Cardoso, José Serra e Aécio Neves e o democrata ACM Neto, prefeito de
Salvador.
É sintomático também da completa desorientação a que Dilma parece
entregue o fato de que até seu criador, o ex-presidente Lula, tem dado
mostras de impaciência e irritação com o fato de que ela apenas "finge
que escuta" seus conselhos. A presidente teima. Mas não escapará de
brevemente anunciar mais uma troca "pontual" de ministros.
EXTRAÍDADOBLOGROTA2014
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