Vinicius Torres Freire FOLHA DE SÃO PAULO
"Que fase." Quando o governo acerta uma no cravo, martela duas na
ferradura e leva três na canela. Na segunda-feira, teve a satisfação
triste e diminuta de saber que não levou ponto negativo em sua nota de
crédito, dada por uma dessas agências de avaliação de risco de calote.
Alegrias pobres duram pouco.
Ontem, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB), disse a líderes
empresariais da indústria que Dilma Rousseff vai comer o pão que ela
própria amassou antes de ver o pacote de corte de gastos do governo
aprovado no Congresso. Foi aplaudido.
Calheiros e o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB) têm dito em
público e a algumas lideranças empresariais maiores que não vão colocar
fogo no circo, não vão derrubar o corte de gastos, o "ajuste fiscal".
Mas a cada dois ou três dias demonstram também que vão triturar
politicamente o governo. Ameaçaram, mas enfim recuaram, deixar correr
projeto de lei que reajusta todos os benefícios do INSS pelo valor do
salário mínimo. Querem fazer valer logo, regulamentar, a lei que reduz a
dívida de Estados e municípios com a União, mais um talho nas receitas
federais.
Ontem, Calheiros cantou alto a ária preferida de empresários e aliás de
quase todo o mundo. Isto é, o governo tem de cortar "seus gastos", não
aumentar impostos, como pretende fazer no caso da contribuição patronal
para o INSS, medida que deixou o empresariado em geral fulo. Mas o
governo vai cortar onde?
Reduzir o número de ministérios rende apenas um troco. Melhorar as
contas do governo ora implica reduzir benefícios sociais, investimento
"em obras" ou fechar partes do governo (isso: fechar).
No entanto, centrais sindicais e movimentos sociais malham e querem
queimar o PT como Judas, para nem falar dos parlamentares que ameaçam
debandar, todos por causa de cortes sociais. Para piorar, o ministro da
Casa Civil, Aloizio Mercadante, foi ontem a público negar que o governo
vá maneirar no talho social a fim de agradar a Lula, ao PT, a agregados e
a simpatizantes.
Logo, vai sobrar ainda mais para os investimentos. A recessão deve,
assim, piorar. Obras vão parar ou ficar sem pagamento, como já acontece,
o que vai causar mais raiva entre empresas e trabalhadores. Em um ano, a
construção civil já demitiu uns 8% de sua força de trabalho, quase 280
mil pessoas na rua.
Suponha-se que Calheiros e Cunha não queiram tocar fogo no circo
econômico (sabem que reduzir o ministério não rende nada em termos
fiscais). Pode ser então que estejam emparedando o governo, ganhando
mais território, talvez até reduzir Dilma Rousseff a presidente do
Vaticano ou de San Marino. Tendo ficado com mais poder ou, quem sabe,
tendo empurrado a presidente no precipício, farão o que da massa falida,
talvez caótica?
Até cortar gasto a machadadas está difícil, pois há muita despesa
protegida por lei, crescente, e a receita do governo não cresce. O
decerto lunático Orçamento federal prevê um AUMENTO real de uns 9% na
receita, mas no primeiro bimestre do ano a receita CAIU 3% em termos
reais.
Enfim, esta é a malhação de Dilma com pauladas econômicas. Há CPIs,
polícia, procuradores, Justiça. Ninguém ainda se arrisca a dar sentido a
esta crise.
EXTRAÍDADOBLOGROTA2014
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