MERVAL PEREIRA O GLOBO
A dificuldade para provar a origem ilegal do dinheiro doado aos partidos políticos é um dos obstáculos encontrados nas investigações, mas aos poucos a Operação Lava-Jato, com cruzamentos de dados e pistas de contas correntes no exterior, está desvendando os caminhos do dinheiro.
Os procuradores trabalham com a mesma lógica com que buscam o dinheiro desviado por bandidos comuns que compram bens, como imóveis e carros, e quadros e obras de artes diversas, para lavar o dinheiro roubado. A apreensão de uma coleção de quadros de artistas brasileiros e estrangeiros num quarto refrigerado da casa do ex-diretor da Petrobras Renato Duque só confirma a tática de lavagem da parte do desvio que ficou de posse do executivo. Procuradores consideram que não será difícil provar isso dentro da mesma lógica dos bandidos comuns, com as planilhas e depósitos bancários que estão apreendendo.
A questão do financiamento de campanhas eleitorais também está em discussão no STF, onde uma Ação direta de inconstitucionalidade da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) contra o financiamento de empresas privadas está parada pelo pedido de vista do ministro Gilmar Mendes, que considera que a questão deve ser definida nos projetos de reforma política que estão em discussão no Congresso.
Nas propostas que estão no Congresso, o financiamento privado é mantido em diversas versões, e apenas o PT é a favor do financiamento público exclusivo, alegadamente para frear a corrupção eleitoral da qual tem sido o principal acusado, mas na verdade porque o financiamento público leva necessariamente à aprovação do sistema de lista fechada, onde as direções dos partidos escolhem os candidatos, e ao eleitor só é dada a opção de votar na legenda partidária.
Apontado o mentor da tese, o ministro Luís Roberto Barroso fez uma análise da questão no site Consultor Jurídico e ressaltou que não considera inconstitucional que empresas participem do financiamento eleitoral. "Esta é uma decisão política, uma escolha a ser feita pelo legislador, isto é, pelo Congresso Nacional, que pode permitir ou vedar tal tipo de participação". O que ele considera "claramente inconstitucional, porque antidemocrático e antirrepublicano, é o modelo atualmente vigente". Para ele, a prova disso é o fato de grandes empresas fazerem doações para diversos candidatos majoritários que são concorrentes entre si.
"Intuitivamente, como apoiam candidatos de posições opostas, não se trata de uma opção ideológica nem do exercício de um eventual direito político (para quem admita que empresas possam titularizar tais direitos). A verdade é que ou tais empresas são achacadas para doar ou, ao fazê-lo voluntariamente, estão comprando benesses futuras. Qualquer das duas possibilidades é péssima".
Essa questão é combatida pela proposta apresentada pelo PMDB, que proíbe a doação a vários partidos por uma mesma empresa. Outra objeção de Barroso é que "não há na legislação qualquer restrição a que empresas que doaram para a campanha sejam contratadas, diretamente ou mediante licitação (e que licitações!), pelo governo do candidato eleito. Vale dizer: o modelo permite que se pague o favor (doação de dinheiro) com dinheiro público (contratos administrativos)".
Sem se referir diretamente ao petrolão, Barroso atribui às doações o papel de abrir portas para contratos governamentais. A lavagem de dinheiro por meio de doações seria um passo à frente nesse assunto. Há também nos projetos em trâmite a proibição de que empresas que tenham concessões governamentais ou façam obras para governos doem a partidos políticos.
"A inconstitucionalidade, portanto, não está na possibilidade de empresas participarem com recursos financeiros do processo político, mas na total ausência de quaisquer limitações minimamente efetivas", ressalta Barroso. Com esse esclarecimento, parece que as posições dos ministros Barroso e Gilmar Mendes coincidem em que caberá ao Congresso definir se empresas podem ou não participar do financiamento eleitoral.
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