editorial de O Globo
Depois de manobra malsucedida para tentar esvaziar o PMDB, Planalto e petistas têm de trabalhar com o aliado para aprovar estratégicas medidas econômicas
O recolhimento da presidente Dilma Rousseff após a posse, como se
houvesse sido derrotada nas urnas de outubro, ganhou dimensões políticas
mais amplas com a divulgação da pesquisa Datafolha em que a
popularidade da inquilina do Planalto, de contrato renovado, foi
reduzida pela metade.
A presidente reapareceu no final de janeiro, na primeira reunião do seu
avantajado ministério. E logo no início de fevereiro foi divulgada a
pesquisa, cujo resultado contaminou a percepção daquele comportamento de
perfil depressivo com que a presidente iniciou o segundo mandato.
Tanto quanto a queda vertiginosa, de dezembro a fevereiro, de 43% para
23% (soma dos conceitos “ótimo” e “bom”) na aprovação da presidente,
destacaram-se os índices elevados dos que consideravam Dilma
“desonesta”, “falsa”, “indecisiva”, bem como daqueles que achavam que a
presidente sabia da corrupção na Petrobras (77%).
Não foi a indicada a reação do governo àquele clima de fim de festa logo
no início do segundo mandato. Dilma continuou distante da proposta de
ajuste fiscal, peça-chave de seu mandato, ainda por cima tratado pelo PT
como obra da oposição.
Parecia que a intenção do Planalto era semear uma tempestade perfeita
sobre o governo quando a articulação política de Dilma, em manobra
típica do exército Brancaleone, tentou armar o esvaziamento do PMDB de
Eduardo Cunha por meio de mais uma reinação de Gilberto Kassab (PSD): o
ministro das Cidades ressuscitaria outra legenda, o PL, para atrair
peemedebistas. Não deu certo, e Cunha ainda ganhou em primeiro turno a
presidência da Câmara, num rolo compressor sobre o Planalto.
Goste ou não, Dilma precisa do PMDB para governar, e o PT deve parar de
fingir que nada tem a ver com o ajuste fiscal, consubstanciado em MPs
com readequações no seguro-desemprego e pensões por morte — pontos fora
da curva da responsabilidade fiscal e do bom senso. Há, ainda, aumento
de impostos.
Dilma e PT, gostem-se ou não, dividem o mesmo governo. O fracasso do primeiro será o naufrágio do segundo.
Lula pode contribuir, na ascendência que tem sobre o PT, com a
experiência de ter patrocinado um ajuste também “neoliberal”, no
primeiro mandato, e que lhe deu sustentação política para ganhar a
eleição presidencial seguinte.
Mas prejudicará o governo se novamente vestir a fantasia de pequeno
Chávez e ameaçar pôr nas ruas o “exército de Stédile", capo do MST,
lamentável bravata feita terça-feira no Rio, na ABI, enquanto seguranças
contratados pelo PT digladiavam na calçada com manifestantes.
Conversas foram retomadas com o PMDB. Falta domar o PT, ainda no divã em
surto oposicionista. Dilma, enquanto parece voltar a governar, precisa
ajudar numa catequese imprescindível: não há alternativa fora do ajuste.
MATÉRIAEXTRAÍDADOBLOGROTA2014
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