- EDITORIAL O ESTADÃO
Não se pode dizer que
tenha causado surpresa o fato de a Operação Zelotes da Polícia Federal
(PF) ter estendido suas investigações à empresa de um dos filhos de Luiz
Inácio Lula da Silva e convocado a prestar depoimento o seu fiel
acólito, Gilberto Carvalho. Muito menos surpreendente foi a reação do
próprio Lula, relatada por testemunhas do desabafo, que extremamente
irritado responsabilizou a presidente Dilma Rousseff e o ministro da
Justiça, José Eduardo Cardozo, por mais esse ato de “perseguição
política”. O paladino da igualdade social, como se vê, continua se
achando mais igual do que todo mundo e, portanto, acima de qualquer
suspeita de ter alguma coisa a ver com o mar de lama que inundou a
política e a gestão da coisa pública como nunca antes na história deste
país.
Para Lula, de acordo com a queixa relatada por amigos, a
ação da PF “passou dos limites”, baseada apenas no “mentirão premiado”,
expressão com a qual, doravante, todo petista que se preze passará a se
referir ao instituto da delação premiada. E a culpa é toda da presidente
da República, que dá ouvidos a seu ministro da Justiça, que por sua vez
não tem pulso nem interesse em “controlar” a PF. Reclamação um tanto
contraditória, uma vez que até algum tempo atrás, quando ainda se sentia
fora do alcance do longo braço da lei, Lula tinha a cara de pau de
gabar-se de que investigações como a do mensalão, que mandou a alta
cúpula do PT para a cadeia, só eram possíveis porque seu governo
garantia à PF e ao Ministério Público Federal (MPF) fartos recursos e
absoluta autonomia para trabalhar.
A Operação Zelotes foi criada
para desvendar esquema de propinas e tráfico de influência no Conselho
Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), órgão encarregado de
fiscalizar débitos de grandes contribuintes com a Receita Federal. O
desdobramento das investigações resultou na prisão preventiva de seis
suspeitos de integrar o esquema de “lobby, corrupção e tráfico de
influência” revelado peloEstado em reportagens publicadas nas últimas
semanas sobre a ação de lobistas que teriam logrado “comprar” a edição,
pela Presidência da República, de Medidas Provisórias (MPs) que
beneficiaram montadoras de veículos com isenção de tributos e de taxas. A
ação policial de segunda-feira incluiu a busca e apreensão de
documentos no escritório da LFT Marketing Esportivo, empresa de Luís
Cláudio Lula da Silva, suspeito de ter recebido propina de R$ 1,5 milhão
da consultoria Marcondes & Mautoni, cujo diretor Mauro Marcondes
Machado integra a lista dos seis presos.
O extraordinariamente
bem-sucedido desempenho dos filhos de Lula no mundo dos negócios –
sempre de alguma forma beneficiados pela generosidade de poderosos
empresários cuja, digamos, amizade o ex-presidente teve a sabedoria de
cultivar depois que deixou o poder – começa a se revelar um ponto
extremamente vulnerável na imagem do chefe da tigrada. Afinal, é
impossível imaginar que não haja nenhuma relação entre o enorme poder
político de Lula e a largueza com que homens de negócio que dependem de
contratos com o governo colocam a mão no bolso para ajudar a prole Da
Silva.
A verdade é que Lula é hoje um homem rico, o que atribui
exclusivamente a sua conhecida condição de palestrante internacional
muito bem remunerado. Ele repele com firmeza as suspeitas de que também
se tem beneficiado do papel de lobista de grandes empreiteiras no País
e, principalmente, no exterior. Argumenta que essa é uma atividade
patriótica por meio da qual muitos ex-presidentes em todo o mundo
colocam seu prestígio a serviço dos interesses nacionais. É verdade. Mas
é preciso considerar – mera possibilidade teórica – que quando se cobra
por isso fica quase impossível distinguir patriotismo de tráfico de
influência. E também não faz mal lembrar o que Samuel Johnson dizia a
respeito do patriotismo e de patriotas.
É perfeitamente natural,
portanto, que a tendência inevitável das investigações dessa corrupção,
que parece só não existir onde não é procurada, seja a de provocar
surtos cada vez maiores de irritação do ex-presidente da República. Pois
é perfeitamente compreensível que Lula sofra muito por descobrir que
não pode confiar na pupila que escolheu a dedo para ser sua sucessora e
guardiã temporária de seu infalível projeto de felicidade para o Brasil.
EXTRAÍDADEAVARANDABLOGSPOT
0 comments:
Postar um comentário