editorial do Estadão
Enquanto Lula corre contra o tempo e age nos bastidores na tentativa de
convencer Dilma a adotar uma “nova política econômica” que preserve o
potencial eleitoral do PT – quer dizer, dele próprio –, seu partido
decide, a pretexto de se defender, partir para o ataque a tudo e a todos
que representam ameaça a seu projeto de poder. Recorrendo ao velho
hábito de usar as palavras para obter efeito exatamente contrário ao que
elas significam, a direção nacional do partido está distribuindo
milhares de cópias de um texto intitulado Em defesa do PT, da Verdade e
da Democracia, que já é mentiroso a partir do título porque não defende
coisa alguma. Ao contrário, dedica-se, em suas 34 páginas, a atacar
ferozmente a Operação Lava Jato, o juiz Sergio Moro, o ministro do STF
Gilmar Mendes, os tucanos, a imprensa, acusando a todos de, com base em
óbvias mentiras, estarem empenhados numa campanha para “eliminar o
partido da vida pública brasileira”.
O PT chegou ao poder mitificando sua identificação com os pobres e os
estratos sociais marginalizados da vida econômica, de modo a, por meio
de marota simbiose, compartilhar o papel de vítima numa sociedade
dominada por opressores perversos, as famosas elites. E foi assim que
ressurgiu – exumado dos despojos da luta de classes retratada pela ótica
do marxismo-leninismo – o argumento central do discurso lulopetista, o
do “nós” contra “eles”. Um discurso que não mudou nem com a ascensão de
Lula à Presidência e que, como se vê, é revigorado no momento em que o
PT, tendo malogrado na tentativa de criar o Paraíso na Terra com seu
voluntarismo vesgo, percebe toda a extensão de sua vulnerabilidade
política, social e, acima de tudo, moral.
É hora, portanto, de dramatizar o papel de vítima exposta à sanha
demolidora daqueles que “mentem sob a proteção da toga, nos mais altos
tribunais, afrontando a consciência jurídica da nação em rede nacional
de TV. Mentem sob a impunidade parlamentar, disseminando o ódio nas
redes sociais. Mentem sob a proteção da autonomia funcional, forjando
procedimentos investigatórios sem base alguma, apenas para produzir
manchetes”.
O tom do documento é patético. Essa chamada “cartilha” destinada a
fornecer argumentos à militância petista afirma que “desde a campanha
eleitoral de 2014 adversários escolheram as investigações da Operação
Lava Jato para insistir em criminalizar” o PT, com o objetivo de “cassar
o registro do partido” por temerem “a quinta derrota consecutiva nas
eleições”. Como se a vitória petista nas eleições municipais do próximo
ano e na presidencial de 2018 fosse favas contadas.
Descontados os exageros que devem ser debitados ao desespero,
concretamente motivado pela decadência do apoio popular ao PT, não se
pode relevar a gravidade do flagrante desrespeito às instituições
democráticas embutido no discurso da liderança petista. Sente-se o PT,
com sua vocação autoritária, no direito de julgar o Poder Judiciário de
acordo com suas próprias conveniências, chegando ao absurdo de afirmar
que seus dirigentes que respondem a denúncias de corrupção têm sido
condenados “sem provas”. Disseram isso por ocasião do julgamento do
mensalão e repetem agora. Ora, se é o PT quem sabe quais culpas resultam
provadas ou não perante os tribunais, para que servem os tribunais?
Seria, então, o caso de o partido que está no governo criar um
comissariado para substituir um dos Três Poderes da República, integrado
por magistrados incompetentes ou mal-intencionados que não sabem
distinguir inocentes de culpados?
Para o PT está tudo errado no trabalho dos delegados, procuradores e
juízes federais – em especial Sergio Moro, a personificação de Satanás
–, porque os petistas pegos com a boca na botija estão sendo mandados
para a cadeia. E tudo isso é consequência – ataca o PT – da forma como
procuradores, delegados e juízes manipulam a “autonomia funcional de que
dispõem”. Em sua enorme soberba e arrogância, os sobas petistas creem
que, só pelo fato de estarem no poder, tudo podem e jamais deveriam ser
contrariados por “subalternos”. Subestimaram a força de instituições
enraizadas na consciência democrática da Nação.
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