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09:52
ANDRADEJRJOR
RUTH DE AQUINO REVISTA ÉPOCA

Amarrar e dar palmadinha excita muitos adultos. Se for consenso, é uma ferramenta erótica como tantas
E
não poderia ser diferente. O livro pornô para amadores Cinquenta tons
de cinza chegou ao telão precedido por uma histeria de marketing
monumental. Uma histeria incompreensível a mulheres realizadas na
horizontal e na vertical, que conseguem prazer pleno na troca real ou na
fantasia sem freios. O roteiro é banal, infantil e chato para quem faz
sexo de verdade na cama e fora dela. Com ou sem amor. De olhos abertos
ou fechados.
Para as heterossexuais bem resolvidas, o homem é um
objeto sexual. A mulher que gosta de homem se ocupa do prazer dele, se
dedica a seu corpo. Não o corpo dela, mas o corpo dele, com todos os
seus mistérios. Homem também tem mistério e ponto H. Não são máquinas de
produzir orgasmos. Aliás, longe disso. Eles precisam de orientações
femininas para ser bons de cama. Mulher que insiste em reduzir o homem
só a “provedor” – de dinheiro ou prazer, ou ambos – não faz jus ao
parceiro nem a si mesma.
Cansei de ver homem reclamando de
mulheres com corpos sensacionais, que se deitam na cama, se olham no
espelho e ficam ali, passivas e maravilhadas consigo mesmas, à espera da
adoração e ação intensiva do parceiro. Ou mulheres que apagam a luz por
vergonha de suas imperfeições como se fossem pecados contra o tesão.
Nada afeta mais o tesão, próprio ou alheio, do que a baixa autoestima. E
isso a personagem do livro e do filme, Anastasia Steele, tem de sobra.
“Sou desastrada, malvestida e não sou loura” (!).
Outra
incompreensão que se escuta nas conversas é a do recurso, interessante,
do sadomasoquismo nas relações sexuais. No telão, o sadomasô
excessivamente estético é ainda mais enfraquecido, por ficar muito aquém
das fantasias. Como se sabe, o roteiro o transforma em contrato, como
esses submetidos ao RH, com cláusulas e multas. Perde assim seu fator X:
a imprevisibilidade, o frescor, a transgressão.
Nos ambientes
acadêmicos ou feministas hard, surgiu agora uma discussão equivocada,
fora do tom. Nos Estados Unidos, há um “movimento” para doar US$ 50 a
abrigos de mulheres espancadas ou violentadas em vez de gastar para ver o
filme. Gail Dines, professora de sociologia no Wheelock College, de
Boston, diz que o filme glorifica relações de abuso.
“A história
mostra um predador sexual sádico que persegue uma mulher bem mais jovem e
abusa dela”, afirma a socióloga. “É um conto de fadas no sentido de não
ser real, mas, na realidade, é uma história de terror vivida por muitas
mulheres.” Hello! Que exagero. Nem essa importância o roteiro tem, a
meu ver. Amarrar e dar palmadinha excita muitos adultos e, se for
consenso, de brincadeira, sem machucar, torna-se uma ferramenta erótica
como tantas.
O BSM – “b” de “bondage”, ou seja, de “amarrar” –
está presente na vida ou nos sonhos de muitas mulheres, suas vizinhas ou
companheiras ou colegas de trabalho ou parentes próximas, mesmo que
seja sexualmente incorreto. Lamento que haja tanto desconhecimento ao se
generalizar o desejo feminino – e o masculino também. Falta conversa,
falta abertura, falta ousadia e sobra repressão nas relações de nosso
cotidiano.
O livro é um fenômeno mundial. Vendeu mais de 100
milhões de exemplares em 52 línguas. Normalmente, livros são melhores
que suas adaptações, pela profundidade e caracterização dos personagens.
Mas, num livro tão ruim com diálogos tão melosos, a linguagem visual e
resumida do cinema poderia produzir algo mais quente e visceral. Não foi
possível. O filme segue rigorosamente a receita de sopão de clichês e a
falta de sexo explícito.
A mocinha morre de excitação no filme
quando morde o lábio inferior. O mocinho não permitiu nu frontal.
Aaaahhh, que peninha. A desculpa oficial é que o ator é casado e acaba
de ser pai pela primeira vez. Minha especulação é que talvez a cena
decepcionasse as fãs do metido a garanhão Christian Grey, porque a gente
sabe que, nas fantasias femininas, tamanho é documento.
Para
sair molhadinha, só se cair uma chuva daquelas no fim da sessão e você
estiver sem casaco impermeável. O que seria, ao menos, uma boa novidade
em tempos de seca – digo seca líquida, falta de água, não de homem.
Abram os olhos, moças, os homens estão por aí e, felizmente, não são
bobos como o Christian Grey.
FONTE AVARANDABLOGSPOT
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