por Eliane Cantanhêde O Estado de São Paulo
Se ninguém vê saídas imediatas para crise, uma percepção vai se cristalizando sobre o médio e longo prazo: a política brasileira está encerrando um ciclo e vem aí um novo que ainda é uma grande interrogação. Ou melhor, contém várias interrogações.
Uma delas é o que vai acontecer com a "esquerda", atingida por mensalão,
petrolão e deterioração da economia depois de 12 anos do PT no poder.
Outra é o que, e principalmente quem, vai representar a "direita",
rótulo sempre rejeitado por partidos e políticos, mas que tende a
encorpar: quanto mais baixo o apoio ao PT e ao governo Dilma Rousseff,
mais alta é a busca pelo campo oposto.
Contraponto direto ao PT, o PSDB é equivocadamente, ou maliciosamente,
tratado como partido de direita. Não pode ser de fato de direita uma
sigla que foi idealizada e fundada por Fernando Henrique Cardoso, Mário
Covas, Franco Montoro e José Serra, dentro dos princípios da
social-democracia.
Os demais partidos estão divididos em grupos. Exemplos: os satélites do
PT, como o PC do B; a centro-esquerda que tenta ser independente, como o
PSB; os que tentaram se afirmar como a direita moderna, liberal, mas
morreram na praia, caso do PFL e seu sucedâneo DEM; a direita
pasteurizada, não ideológica, que está na política para devorar nacos de
poder e riqueza, caso do PP.
E o PMDB? O PMDB é o PMDB, assume uma cor em cada Estado, uma fantasia a
cada governo, e assim vai se tornando indispensável à esquerda, ao
centro e à direita, sempre de prontidão, para eventualidades.
Vejamos o vice-presidente Michel Temer. Faz todos os gestos de lealdade a
Dilma, mantém canais com o PSDB e nem estimula nem contém Renan
Calheiros e Eduardo Cunha, mas se beneficia indiretamente da ação de
ambos no Congresso.
Logo, quem e o quê vai entrar no vácuo deixado pela esquerda? Como a
direita vai tentar tirar proveito da desgraça do PT e emergir dessa
crise e desse ciclo?
Com a redemocratização, há 30 anos, todo o ciclo faz sentido: José
Sarney, velho aliado dos militares, mas de temperamento negociador;
Fernando Collor, o "caçador de marajás" que significava uma ruptura;
Itamar Franco, a transição pacífica, sem lado e sem ambições; Fernando
Henrique, o sociólogo e professor pragmático; depois Lula, migrante
nordestino, sindicalista, líder de massas; e, enfim, Dilma Rousseff,
mulher, ex-presa política, uma "gerentona".
A roda girou 360 graus e cá estamos no fim de um ciclo e quebrando a
cabeça para prever qual será, e como começará, o próximo. As Forças
Armadas estão fora, a direita não produziu nenhuma cara, nenhum nome, e
caçador de marajás não cola mais, Temer só faria sentido numa transição à
la Itamar. E não só pode estar cedo demais para se voltar a um Fernando
Henrique ou a um novo líder carismático como Lula como simplesmente não
há nenhum FHC e nenhum Lula à disposição nas prateleiras da política.
A demanda do eleitorado vai estar mais e mais à direita, mas os partidos
de direita não se consolidaram como opção, os Bolsonaros não podem pôr o
pé fora de casa sem serem vaiados e a oferta de partidos e de
candidatos não mudará muito em relação ao que se tem neste momento.
Apesar do grande cansaço da opinião pública, a polarização entre PT e
PSDB tende a se manter, com um arrivista correndo por fora.
Os dois partidos têm de buscar um equilíbrio muito delicado. O PT tem de
reanimar a esquerda e ao mesmo tempo recuperar a massa de eleitores não
ideológicos que ganhou a partir de 2002, mas perdeu. E o PSDB tem de
manter o seu eleitor tradicional, fisgar o eleitorado que se desencantou
com o PT e agasalhar o eleitor de direita que tem uma só prioridade:
derrotar a esquerda.
Moral da história: o processo político, que tem lá suas manhas, empurra o
PT ainda mais para a esquerda, e o PSDB, para a direita. Ambos, a
contragosto. E olhando de soslaio para não se surpreenderem com os
arrivistas.
EXTRAÍDADOBLOGROTA2014





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