por Rogério Furquim Werneck
Na farra fiscal de 2014, a presidente apostou na leniência do Tribunal de Contas da União
Afirmar que a presidente vem passando por longo período de inferno
astral seria atribuir aos astros culpa que não lhes cabe. Dilma está
apenas colhendo o que plantou. E, nessa colheita farta, vem mostrando
espantosa capacidade de tornar cada revés bem mais desgastante do que
poderia ser.
Sem ir mais longe, basta ter em conta seu destempero diante de novas
delações que deixaram o Planalto especialmente irritado. A presidente se
permitiu comparar os delatores da Lava-Jato a Joaquim Silvério dos
Reis, suposto alcaguete da Inconfidência Mineira, figura que, no
imaginário brasileiro, representa o arquétipo do traidor desprezível.
Não lhe ocorreu que tal comparação ensejaria imediata indagação sobre a
razão pela qual o Planalto viu traição tão grave na delação de Ricardo
Pessoa.
Em meio às suas muitas atribulações, a presidente terá de encaminhar ao
Tribunal de Contas da União (TCU), até meados de julho, explicações que
possam evitar que suas contas de 2014 sejam rejeitadas. Os apuros do
governo no TCU vêm sendo bem cobertos pela mídia. Mas a questão tende a
ser percebida como matéria árida, de digestão difícil para leigos. A
aridez dos detalhes, contudo, em nada impede percepção clara da essência
dos problemas que o governo vem enfrentando no Tribunal.
É preciso não perder de vista o quadro mais amplo que acabou dando lugar
a tais problemas. É mais do que sabido que, no ano passado, a condução
da política econômica foi inteiramente pautada pelas prioridades da
campanha de reeleição da presidente Dilma.
No caso da política fiscal, o atrelamento às urgências da campanha
eleitoral foi particularmente inconsequente. E exigiu precária
conciliação, ainda que por poucos meses, de dois movimentos patentemente
conflitantes.
De um lado, o governo se permitiu uma farra fiscal sem limites, quando
já não cabia mais dúvida sobre a extensão da devastação que vinha
ocorrendo nas contas públicas, na esperança de que isso pudesse mascarar
a rápida desaceleração do crescimento da economia. De outro, fez o
possível para maquiar as contas públicas e impedir que o eleitorado
tomasse conhecimento em tempo hábil das reais proporções dessa
devastação.
Apesar de todos os sinais de que a política econômica era insustentável e
das pressões, inclusive de parte do próprio PT, para que a equipe
econômica fosse mudada, a presidente insistiu em manter a mesma
tripulação até o último momento. No sufoco de uma campanha que se
desdobrou em dificílimo segundo turno, a candidata entendeu que não
poderia prescindir de uma equipe fazendária que não titubeasse diante da
necessidade de levar adiante, a qualquer custo, a gestão fiscal que a
campanha eleitoral parecia requerer.
Por irresponsável que tenha sido, a aposta de Dilma foi coroada de
sucesso. A presidente acabou reeleita. E, como estelionato eleitoral não
é crime, conquistou mais quatro anos de mandato. Mas o diabo mora nos
detalhes. Na história dos grandes golpes supostamente perfeitos não
faltam casos de quem acabou apanhado por se ter esquecido de um pequeno
detalhe.
Na pressa e na euforia da campanha eleitoral, Dilma esqueceu-se da Lei
de Responsabilidade Fiscal (LRF). Ou talvez tenha simplesmente confiado
na leniência passada do TCU com infrações anteriores, sem dar a devida
atenção ao fato de que, desde que a LRF foi aprovada, em 2000, nunca
houve nada parecido com o descalabro fiscal que se viu em 2014.
Entre os muitos problemas agora detectados, o TCU acusa o governo de, no
afã de maquiar as contas de 2014, ter deliberadamente permitido que o
Tesouro recorresse a vultosos financiamentos de instituições financeiras
federais, em séria violação da Lei de Responsabilidade Fiscal.
A se julgar pelas explicações esfarrapadas que vêm sendo alinhavadas
pelo governo, é bem possível que a presidente acabe tendo suas contas
rejeitadas pelo TCU. O que a deixaria perigosamente exposta à
confirmação da rejeição das contas pelo Congresso.
extraídaderota2014blogspot
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