por Dora Kramer O Estado de São Paulo
Na semana passada a reforma política saiu do papel para entrar no
escaninho da mesmice. Estaria até de bom tamanho se ao fazer andar a
reforma a Câmara não tivesse optado pelo modo retrocesso na única
mudança significativa: o fim do instituto da reeleição.
De maneira torta – mudando a regra no meio do jogo – em 1997 o Brasil
adotou regra vigente em democracias civilizadas, onde ao cidadão é dado o
direito de reconduzir o governante bem avaliado e a este a oportunidade
de consolidar projetos bem sucedidos. Este era o princípio e o
argumento em defesa da norma.
Agora, decorridos insignificantes 18 anos, a maioria expressiva dos
deputados e, segundo consta com apoio da maior parte do Senado, propõe a
revogação alegando que a reeleição já cumpriu seu “papel histórico”.
De qual papel e de qual história estamos falando? Desde quando menos de
duas décadas podem significar algo além de mera vírgula em termos de
História? Desde nunca. Simplesmente porque não é essa a razão
verdadeira.
Bem como não há fundamento na alegação de que o instituto da reeleição é
o grande patrocinador do uso da máquina pública nas campanhas
eleitorais. Fosse assim, teríamos de admitir que tal prática
inaugurou-se no Brasil em 1997.
Seria também necessário aceitar que o então presidente Luiz Inácio da
Silva não usou nem abusou do aparelho de Estado em 2010 para eleger a
sucessora, apenas porque não era ele o candidato naquela eleição. Fez e
aconteceu, todo mundo viu. E ali não havia reeleição. Portanto, esse não
é fator determinante.
Governantes já perderam eleição no cargo. Inclusive do PT. Marta Suplicy
na prefeitura de São Paulo é um exemplo. Eduardo Azeredo no governo de
Minas Gerais é outro. Reeleição não é garantia, não é por si só motivo
de fisiologismo nem é a “raiz da corrupção”. Óbvio que se podem fazer as
coisas de maneira correta. Todo mundo sabe como fazer.
Muito bem, então, qual é o ponto? O ponto é que a reeleição teve um
efeito colateral: tornou mais lento o rodízio de candidatos dentro dos
partidos.
Isso quer dizer o seguinte: suas excelências não estão preocupadas com a
lisura do processo coisa alguma. Só estão de olho na reorganização da
fila interna de candidatos à presidência. Os tucanos, por exemplo:
enquanto só tinham Fernando Henrique, a eles interessava a reeleição.
Agora que o PSDB tem Aécio, Alckmin e Serra como possíveis candidatos à
presidência da República em 2018, o partido quer “abrir” o rodízio. Para
os que em 1997defenderam a reeleição daquela maneira, francamente,
falar o contrário nessa altura com toda essa pompa é quase uma piada de
mau gosto.
Mas não foi só isso. A “reforma” manteve o sistema eleitoral como está.
Proporcional. Aquele pelo qual você vota em um, elege outro e não sabe o
que fez. Tudo por meio de negociações sobre as quais o eleitor não
tomou conhecimento. A respeito delas tampouco diziam a vida de que é
dono do voto.
Cláusula de barreira poderia dar um basta da proliferação de partidos,
mas a forma frouxa negociada atendeu apenas aos interesses internos.
Privilegiou as legendas de aluguel e prejudicou os partidos ditos
ideológicos. Um troca-troca interno do qual o eleitor esteve fora o
tempo todo.
O quem vem pela frente não desenha cenário melhor. Há ainda proposta
para unificar as datas das eleições para presidente, governador,
deputados, senadores, vereadores e prefeitos. Isso significa, na
prática, a ocorrência de menos eleições.
Junto a isso, essa “reforma” ainda abre mais espaços para situações de
infidelidade partidária. Todo o trâmite atendeu a interesses
corporativos. Não houve um momento em que estivesse em jogo o ponto de
vista do eleitor. Este nunca foi levado em conta.
Portanto, uma reforma que não vale. Pelo simples fato de que não leva em conta o principal.
extraídaderota2014blogspot
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