por Clóvis Rossi FOLHA DE SÃO PAULO
Desde que comecei a acompanhar a política brasileira, já se vai meio
século, sempre ouvia rumores sobre a promiscuidade entre políticos e
empreiteiras.
Tanto é assim que a sigla OAS era traduzida, antigamente, por "Obras
Arranjadas pelo Sogro", em alusão ao fato de que César Mata Pires,
fundador e sócio majoritário da empreiteira, era genro de Antonio Carlos
Magalhães (1927-2007), expoente civil do regime militar e o único
ministro civil que não foi trocado no período Sarney (1985-1990).
Em sendo assim, não poderia me surpreender a suspeita de envolvimento de grandes empreiteiras na operação Lava Jato.
O que, sim, me leva a estado de choque é o fato de que os presidentes da
Odebrecht, Marcelo Odebrecht, e da Andrade Gutierrez, Otávio Marques de
Azevedo, tenham se juntado à lista de executivos presos ou que já
passaram pela cadeia, por ordem do juiz Sergio Moro.
Pareciam intocáveis, não só pelo peso econômico de suas empresas mas também pela proximidade com o mundo político.
Antes de prosseguir, é de sentido comum ressalvar que, antes do
julgamento definitivo, todos são inocentes. Assim mesmo, é todo um
acontecimento.
A excelente repórter que é Raquel Landim chegou a afirmar na sua coluna
que "a prisão desses executivos demonstra que está em curso um desmonte
do Estado clientelista no Brasil".
Explica em seguida: "Grandes empresas sempre tentaram se aproximar dos
poderosos de turno, mas, nos últimos anos, essa tendência se exacerbou,
porque o Estado se tornou o grande indutor do desenvolvimento da
economia".
Pode ser, Raquel, mas suspeito de que, na ditadura, essa tendência tenha
sido igualmente forte ou até mais forte, dada a necessidade de tocar
projetos faraônicos do "Brasil Grande".
Diga-se que, nos primórdios do escândalo, a presidente Dilma Rousseff teve um pensamento parecido ao de Raquel agora.
Afirmou a presidente que o atual escândalo "mudará para sempre a relação
entre a sociedade brasileira, o Estado brasileiro e a empresa privada".
Perdão pelo meu ceticismo, Dilma e Raquel. Mas anos de testemunha ocular
do funcionamento do mundo político me autorizam a ser exacerbadamente
cético.
Afinal, a própria Dilma, na entrevista acima citada, já fazia a
ressalva: "Não dá para demonizar todas as empreiteiras. São grandes
empresas e, se A, B, C ou D praticaram malfeitos, pagarão por isso.
Agora, isso não significa que a gente vai colocar um carimbo na
empresa".
Seria justo, se a investigação não tivesse chegado ao topo das grandes
empreiteiras. Os suspeitos não são apenas o diretor A ou o executivo B,
mas os chefões.
Se existem "malfeitos", é possível que eles sejam praticados sem que a alta cúpula da empresa saiba (ou ordene)?
É saudável que o habeas corpus retórico que a presidente lançou tenha
sido contraditado, nas prisões recentes, pelo próprio nome da nova fase
da operação Lava Jato: Erga Omnes, que, em tradução livre, seria "a lei
vale para todos", grandes ou pequenos.
Se valer mesmo, Raquel Landim terá sido profética. Tomara.
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