por Mary Zaidan Com Blog do Noblat - O Globo
Com truques, mentiras e hostilidade, o governo da Venezuela impediu que
senadores brasileiros entrassem em Caracas. Uma besteira sem igual para
Nicolás Maduro, um déspota despreparado, cada dia mais agonizante e
aflito frente à profunda crise em que seu padrinho Hugo Chávez e ele
próprio meteram o país.
Não bastasse, o governo brasileiro aumentou a lambança: o embaixador Rui
Pereira recebeu, mas não acompanhou a comitiva; o Itamaraty tardou a se
pronunciar e o fez de forma tímida, meramente protocolar. E a
presidente Dilma Rousseff não deu um pio.
Em uma visita que poderia ser corriqueira, desprovida de charme, os dois governos ficaram na berlinda.
Mas por que raios ambos se expuseram tanto?
Não há como negar os laços do PT com o bolivarianismo e tudo que essa
corrente autodeclarada de esquerda representa. Uma estranha identidade
que associa a redenção dos pobres a práticas nada dignificantes:
partidarização e ocupação do Estado, corrupção, enriquecimento ilícito,
mutretas. Gente disposta a fazer o diabo para se manter no poder.
Fora o público cativo, os militantes cegos que a tudo dizem amém, é difícil crer que o ideário seja o principal elo.
As recentes descobertas da Polícia Federal apontando o envolvimento da
petroleira estatal venezuelana com lavagem de dinheiro no Brasil que o
digam.
Tudo indica que há muita linha para se desembaraçar no novelo. E que os
nós são mais mundanos, monetários e pragmáticos do que ideológicos.
No auge de sua popularidade, o todo-poderoso Lula fazia mesuras a
Chávez, cedendo-lhe mais do que o máximo. Celebrou com fogos de
artifício a parceria da Petrobras com a PDVSA para a construção da
refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco. Mas Chávez não colocou um tostão.
Orçada em US$ 2 bilhões, a obra bateu na casa dos US$ 20 bilhões, 100%
bancada pela estatal brasileira, que hoje amarga o prejuízo.
Sabe-se pouco ainda das transações de Lula-Chávez-Odebrecht, empreiteira
que na última sexta-feira teve seu presidente preso na Operação Lava
Jato, suspeito de envolvimento direto na roubalheira que correu solta na
Petrobrás.
Reportagem da revista Época,
publicada em abril, informa que em um encontro com Chávez em Salvador,
em 2009, Lula acertou, pessoalmente, o financiamento de US$ 747 milhões
do BNDES para que a Odebrecht tocasse as obras do metrô de Caracas.
Hoje, o valor do financiamento teria ultrapassado a casa de US$ 1,6
bilhão.
Já era muito, mas não parou por aí. À Venezuela ceder tudo virou mantra.
Durante o primeiro mandato de Dilma, Chávez conseguiu entrar no
Mercosul depois de o Brasil apoiar e convencer seus pares a suspender
temporariamente o Paraguai, único país que ameaçava a presença da
Venezuela no bloco.
E João Santana, marqueteiro responsável pela vitória da pupila de Lula,
desembarcou em Caracas para coordenar a campanha de Maduro. Com vídeos
do metalúrgico que chegou à Presidência do Brasil e a repetição da
fórmula de críticas às elites, Santana venceu apertado. Mas chegou lá.
Difícil apostar que a proximidade ideológica tenha orientado toda essa
cooperação nada convencional entre os dois governos e provocado o clima
de barata tonta na visita frustrada dos senadores a Caracas.
Na política não há espaço para ingênuos. E é ingenuidade crer no inverso.
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