editorial do Estadão
A extraordinária elevação dos recursos previstos no Orçamento-Geral da União de 2015 para o Fundo Partidário, de R$ 289,56 milhões para R$ 867,56 milhões, demonstra o grau de descolamento da realidade hoje em vigor no Congresso. Em meio a um duro ajuste fiscal e ao aperto generalizado de cintos, sem falar do escândalo de corrupção da Petrobras envolvendo o pagamento de propina a políticos e partidos, os parlamentares viram por bem triplicar a verba pública destinada pelo Executivo às suas agremiações.
O relator-geral da proposta orçamentária, senador Romero Jucá (PMDB-RR),
disse que o aumento do Fundo Partidário é uma espécie de "teste" de
viabilidade do financiamento exclusivamente público para as campanhas -
tal como defende o PT. "É preciso ver como se comporta a opinião
pública", disse Jucá, igualando o Congresso a um laboratório que faz
experiências para testar o humor dos contribuintes. É, no mínimo,
pitoresco.
Por trás do tal experimento está uma realidade incontornável: a torneira
das doações eleitorais secou, graças, principalmente, ao amplo
envolvimento dos costumeiros doadores no escândalo da Petrobras.
Enquanto alguns dos mais importantes financiadores estão às voltas com a
Justiça, outras empresas, que poderiam bancar os partidos, temem danos à
sua imagem no futuro e preferem, por ora, não abrir a carteira.
Portanto, o aumento dos recursos do Fundo Partidário virá em boa hora
para os partidos, a começar pelo PT, cujo tesoureiro, João Vaccari Neto -
agora às voltas com a Polícia Federal e o Ministério Público - teve
dificuldade para fechar as contas. Em dezembro passado, às vésperas da
festa da posse da presidente Dilma Rousseff, ele chegou a pedir
"criatividade" aos petistas para arrecadar recursos para bancar o
evento, pois o PT estava com problemas de caixa.
O Fundo Partidário agora turbinado sugere que o debate caminha no
Congresso para onde o PT quer, isto é, para a defesa do financiamento
público. Se o critério para a distribuição desse aporte for semelhante
ao que vigora hoje no Fundo Partidário - 95% são rateados de acordo com o
tamanho das bancadas -, então o grande beneficiado será o próprio PT.
Isso explica o ardor com que os próceres do partido vêm defendendo o
financiamento público. Como se o PT não tivesse sido o maior
beneficiário de doações de pessoas jurídicas na última década, o
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva chegou a dizer que se trata da
"forma mais honesta na face da terra de financiar uma campanha para não
permitir que os empresários tenham influência na eleição da pessoa".
Não é trivial o debate sobre o financiamento dos partidos, pois não é
possível participar de eleições sem dinheiro, ainda mais em tempos de
marqueteiros pagos a peso de ouro. Mas a atual crise política deixa
claro que é preciso acabar de vez com o financiamento das campanhas
eleitorais por parte de empresas, pela simples razão de que empresas não
votam - e, portanto, não podem tomar do eleitor comum o poder de ditar
os rumos das eleições e de influenciar o governo escolhido nas urnas.
Assim, em lugar do modelo atual, o certo seria permitir o financiamento
por parte de pessoas físicas, isto é, os cidadãos, aos quais corresponde
de fato o protagonismo nas eleições.
A "experiência" aprovada no Congresso, que triplica o Fundo Partidário,
vai na contramão de uma reforma que represente uma efetiva melhora no
sistema político. Como sempre acontece quando a situação aperta, a
solução foi recorrer ao maltratado bolso do contribuinte.
O Fundo Partidário tem sido ampliado desde 2011 para dar conta do
aumento do número de partidos, mas, mesmo assim, a parte que cabe às
maiores legendas foi ficando cada vez menor. Dessa maneira, em vez de
criar cláusulas de barreira que refinem a representação no Congresso,
impedindo a entrada de partidos criados por oportunistas interessados
apenas em nacos do Fundo Partidário, os parlamentares preferiram
aumentar a injeção de recursos públicos, tornando o butim ainda mais
atraente.
extraídadoblogrota2014
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