por Aécio Neves
O Globo
Tamanho da derrota do PSDB parece incomodar o PT
Uma coisa é preciso reconhecer: a retórica petista costuma ser muito bem
ensaiada e orquestrada quando se trata de tentar impor uma “verdade” à
opinião pública. Agora, o mantra parece um só: “A eleição acabou, é
preciso descer do palanque.” É o que ouvimos, dia após dia, de políticos
e autoridades ligados ao partido, numa tentativa de desqualificar a voz
da oposição. Mas, afinal, o que incomoda tanto essas pessoas?
O fato é que eles estão perplexos diante do país novo que surgiu das urnas.
Como é de conhecimento público, ainda no fim do dia 26 de outubro,
telefonei para a presidente para cumprimentá-la pela vitória. Não houve
qualquer questionamento quanto ao resultado da votação. Cumpri, em nome
da coligação que representava, o rito civilizado e democrático de
cumprimentar o vencedor, embora, de forma surpreendente para muitos
analistas, a presidente, em seguida, tenha optado por omitir da
população essa informação como seria a praxe e tradição.
A eleição acabou, de fato, há quase dois meses. Apesar da utilização
maciça de métodos pouco éticos, o grupo petista conquistou o direito de
permanecer no comando do país. Outro resultado que merece o mesmo
respeito é a constatação de que há uma oposição referendada por 51
milhões de brasileiros. O tamanho da derrota do PSDB parece incomodar
profundamente o PT.
Esta parece ser a grande novidade da cena política. Pela primeira vez,
nos últimos anos, se configura a existência de uma oposição ampla,
profundamente conectada à opinião pública. Chega a ser constrangedora a
posição do partido governista diante da dificuldade de lidar com esta
realidade.
A agremiação que protagonizou a mais ferrenha, intransigente e
sistemática oposição contra todos os avanços institucionais implantados
no país desde a redemocratização, a começar pelo Plano Real, hoje prega a
necessidade de uma oposição silenciosa e se ofende com a presença de
brasileiros nas ruas, indignados com a corrupção.
A sociedade está dizendo, em alto e bom som, que não aceita mais os
métodos utilizados pelo PT, mas há quem não queira ouvir, justamente
porque ainda não desceu do palanque. Perplexo, o partido enxerga
brasileiros mobilizados em defesa do país apenas como adversários do PT.
Sair do palanque implica reconhecer que há papéis distintos na
democracia, e um destes papéis cabe à oposição exercer, fiscalizando o
poder, denunciando erros e abusos, inquirindo as autoridades,
apresentando alternativas.
Na lógica do PT, só têm o direito de ocupar as ruas os movimentos que
defendem o partido. Para tentar tirar a legitimidade de milhões de
brasileiros, de forma desrespeitosa, tentam associar todos os opositores
a defensores de ditaduras. É importante que o partido aprenda a
conviver com esse novo protagonista da cena política — o cidadão que
democraticamente protesta e não se cala. Pois, ao lado dele, a oposição
também não vai se calar.
A vitória deu ao PT a oportunidade de corrigir erros que não foram
poucos, mas não lhe garantirá salvo-conduto para continuar atentando
contra a ética e a inteligência dos brasileiros.
FONTE ROTA2014
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