Por ARY FONTOURA
Meu nome é Ary Fontoura, sou brasileiro, tenho 81 anos, e exerço o ofício
de ator. Acredito que, por também ser uma figura pública, Vossa
Excelência tenha assistido algum dos meus trabalhos, seja no teatro, no
cinema, ou na televisão. Visto que vivemos num país onde a liberdade de
expressão é primazia, venho solicitar, através desta carta, me
utilizando desta rede social, em nome de mais de duzentos milhões de
brasileiros, a sua renúncia. Esforço-me, contudo, em explicar o meu
pedido e, antes, permita-me algumas considerações.
Já vivi o bastante e ao longo de todos esses anos pude ver um grande
número de presidenciáveis que, desde a Proclamação da República, seja
por indicação direta das Forças Armadas, por movimentos revolucionários,
por Golpe Militar, ou por voto direto, governaram este país. Assim como
a Senhora, sobrevivi aos duros Anos de Chumbo e, confesso, fui um
admirador dos companheiros, cujos ideais socialistas lutaram contra o
Regime Militar. Mas, depois de todo esse tempo, ainda aguardo um grande
Presidente para o nosso país. E acrescento que continuaremos sem tê-lo,
enquanto houver um “telefone vermelho” entre Brasília e o Guarujá ou São
Bernardo do Campo.
Em 24 de agosto de 1954, o Presidente Getúlio Vargas se matou em seu
quarto com um tiro no peito. Na carta-testamento ele registrou: “Eu vos
dei a minha vida. Agora ofereço a minha morte. Nada temo. Serenamente
dou o primeiro passo no caminho da eternidade e saio da vida para entrar
na história”, preferindo o suicídio a se submeter à humilhação que os
adversários queriam com a sua renúncia.
Em 1961, o então Presidente Jânio Quadros, alegando “forças ocultas”,
renunciou e disse: “Desejei um Brasil para os brasileiros, afrontando,
nesse sonho, a corrupção, a mentira e a covardia que subordinam os
interesses gerais aos apetites e às ambições de grupos ou de indivíduos,
inclusive do exterior. Sinto-me, porém, esmagado. Forças terríveis
levantam-se contra mim e me intrigam ou infamam, até com a desculpa de
colaboração”.
No próximo dia 1º, Vossa Excelência subirá a Rampa do Planalto em
direção à governança. No entanto, a subida será solitária, ainda que
partidária e com bases aliadas. Mas saiba que duzentos milhões de
brasileiros, mais uma vez, subirão com a Senhora, na esperança de se
desenvolverem como cidadãos, e de ascenderem coletivamente num país
melhor. Por isso, reforço o meu pedido inicial de “renúncia”.
Como chefe maior dessa Nação, como Presidente ou Presidenta, renuncie
à corrupção, aos corruptores, aos corrompíveis, aos corrompidos;
renuncie à roubalheira política, aos escândalos na Petrobras; renuncie à
falta de vergonha e aos salários elevados de muitos parlamentares;
renuncie aos altos cargos tomados por ladrões; renuncie ao silêncio e ao
“eu não sabia”; renuncie aos Mensaleiros; renuncie ao apadrinhamento
político, aos parasitas, ao nepotismo; renuncie aos juros altos, aos
impostos elevados, à volta da CPMF; renuncie à falta de planejamento, à
economia estagnada; renuncie ao assistencialismo social eleitoreiro;
renuncie à falta de saúde pública, de educação, de segurança (Unidade de
Polícia Pacificadora não é orgulho para ninguém); renuncie ao
desemprego; renuncie à miséria, à pobreza e à fome; renuncie aos
companheiros políticos do passado, a velha forma de governar e, se
necessário, renuncie ao PT.
Dizem que o Natal é uma época de trégua e que em Brasília a guerra só
recomeça depois do Ano Novo. Para entrar na história, porém, não será
necessário ser extremista como Getúlio e Jânio e renunciar a Presidência
da República, mas será necessário não renunciar ao seu país, ao seu
povo. Governe com os opositores, governe com autonomia. Faça o seu Natal
ser particularmente inspirador e se permita que a sua história futura
seja coerente com o seu passado, porque o brasileiro tem o coração cheio
de sonhos e alma tomada de esperanças.
fonte tribunadaimprensa
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