editorial de O Globo
O déficit em mercadorias e serviços com o exterior fechará o ano em 4% do PIB, patamar bem acima da média histórica do país, hoje mais dependente de poupanças externas
O Brasil deve fechar este ano com um déficit em suas transações
correntes (mercadorias e serviços) com o exterior de US$ 86 bilhões,
segundo estimativas do Banco Central. É um déficit que bate na casa de
4% do Produto Interno Bruto (PIB), quase o dobro da média histórica do
país.
Economistas geralmente associam esse déficit não a um rombo, a um
desequilíbrio, mas sim a uma necessidade de absorção de poupanças
externas. Se o país está investindo fortemente ou consumindo além do que
pode, não consegue poupar internamente o que precisa para se financiar.
Se tem acesso a poupanças externas (sob a forma de aportes de capital
ou empréstimos), o balanço de pagamentos com o exterior acaba sendo o
instrumento de equilíbrio para a economia.
No entanto, um déficit nessas proporções não pode ser mantido por longo
tempo, pois há o risco de investidores e financiadores interromperem,
repentinamente, o fluxo de capitais. O Brasil já viveu crises sérias no
passado com esse tipo de interrupção, provocado até mesmo por fatores
alheios à economia do país. É claro que, em função dessas crises, foram
criados mecanismos de defesa, como o câmbio flutuante. O ajuste pode ser
feito com certa rapidez pela taxa de câmbio, embora se saiba que a um
custo social elevado (recessão, inflação e desemprego). O volume de
reservas gerenciadas pelo Banco Central, hoje da ordem de US$ 370
bilhões, também é um anteparo contra crises passageiras no exterior.
Seja como for, o déficit em transações correntes parece ter atingido seu
ponto máximo. Para segurança da economia, a trajetória terá de ser de
declínio, voltando, em termos relativos, à média histórica. A
desvalorização do real frente ao dólar deve contribuir para uma
recuperação das exportações em 2015, inclusive para mercados que haviam
se retraído, como os europeus. A Associação de Comércio Exterior (AEB)
prevê para o ano que vem superávit comercial. A exportação de bens
manufaturados, que carregam em si mais valores, chegou a representar 50%
das vendas do país, índice que o Brasil deveria se esforçar para
reconquistar.
Como a redução do déficit está ligado a uma menor dependência de
poupanças externas, a política macroeconômica terá de caminhar nessa
direção. O ajuste fiscal será fundamental nessa equação, porque o setor
público é o que menos poupa internamente e tem grande peso na economia.
Quando deixa de poupar, o setor público avança pelo que é poupado pelas
famílias e o setor privado, e isso é um dos fatores estruturais que
obrigam o Brasil a conviver com taxas de juros bem mais altas do que a
média internacional. Felizmente o déficit em transações correntes tem
sido financiado em sua maior parte por investimentos diretos, e não
apenas por dívida. E tais investimentos têm que apostar no sucesso da
economia para obter o retorno esperado.
FONTE ROTA2014
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