por Vinicius Torres Freire
Dá o que pensar o discurso de diplomação da presidente reeleita Dilma
Rousseff. Que tumulto de transmigração de alma haveria ali entre Dilma 1
e Dilma 2, que mistura adúltera de tudo, que foi sem ter ido, com nomes
demais para ter um nome, como dizia o poema de Tristan Corbière?
Desculpem a citação, tão mal alocada quanto o capital da Petrobras.
Na despedida, os economistas de Dilma 1 acabam de reafirmar aquilo que
os economistas de Dilma 2 acabam de desdizer, com a anuência aparente
das duas presidentes.
Além do mais, ao ser diplomada como Dilma 2, a presidente voltou a
atribuir a críticos a responsabilidade por feitos de Dilma 1, alguns dos
quais de resto reafirma.
"Temos que saber apurar e saber punir, sem enfraquecer a Petrobras...
Temos que continuar apostando na melhoria da governança, no modelo de
partilha para o pré-sal e na vitoriosa política de conteúdo local.
Temos que continuar acreditando na mais brasileira das nossas empresas,
porque ela só poderá continuar servindo bem ao país se for cada vez mais
brasileira", discursou a presidente, nacional-desenvolvimentista
confirmada nestas palavras, com as quais de resto chama de
"entreguistas" quaisquer críticos da gestão ruinosa da empresa.
Foi a política padrão de Dilma 1 que enfraqueceu tanto a Petrobras quanto o Tesouro Nacional.
Uma política de negligência com endividamentos insustentáveis, de
descaso com a restrição orçamentária e desdém pela ideia de que podem
existir usos mais eficientes de recursos mesmo, ou principalmente,
quando tais escolhas não ratificam lendas do nacional-empresismo que
entre os anos 1950 e 1980 ajudou a cimentar uma das sociedades mais
desiguais do mundo.
Em algumas ocasiões, em becos sem saída, Dilma 1 deu o braço quebrado a
torcer: na privatização dos aeroportos, na revisão das concessões de
estradas. Mas o que estaria se passando entre ela e seus botões, agora
que aprovou ao menos um plano inicial de desmanche da política econômica
do seu primeiro mandato?
Ainda que a política Dilma 1 tenha chegado a um limite evidente, segundo
as ideias da própria presidente e de ministros fiéis, uns de saída,
outros restantes, o caso seria de "dobrar a aposta", de dar mais remédio
"anticíclico", não de dieta, de "ajuste".
Na diplomação, a presidente ofereceu "luta renovada" pela "estabilidade
fundada no crescimento sustentado, no controle da inflação, no
crescimento que vai se acelerar mais rápido do que alguns imaginam".
Quem "imaginam"? Os que criticavam a política de Dilma 1 ou os que
lamentam a "guinada ortodoxa" de Dilma 2?
Em agosto de 2013, o colunista escrevia isto, aqui: "De mãos quase
atadas, pois não tem como manejar o gasto público e os juros sobem, dada
a inflação persistente, o governo agora limita o diálogo público a
queixas sobre o pessimismo de seus críticos ou inimigos".
"[Dilma] Não revê o seu curso apenas porque está emparedada pela eleição
próxima, a qual poderia perder se mexesse a fundo na economia? ... Ou
teimosa e iludida acredita que foi vítima dos azares de um mundo
conturbado e do pessimismo de adversários?"
De certo modo, o mistério permanece.
rota2014
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